Universidades dos EUA “recrutam” brasileiros

14 de janeiro de 2009 - 07:38

Conselho quer ampliar de 3,5% para 10% o índice de estrangeiros na graduação; brasileiros estão entre os mais procurados. Estudar em uma das 40 instituições que estão no projeto, a maioria delas públicas, custa de US$ 10 mil a US$ 20 mil por ano

Daniel Bergamasco escreve para a “Folha de SP”:

Um grupo de 40 universidades americanas (a maior parte delas públicas) criou um conselho para atrair mais estudantes estrangeiros. Brasileiros estão “em falta” e, portanto, ficam entre os mais desejados.

A estratégia do Conselho Americano de Recrutamento Internacional, conhecido por Airc, na sigla em inglês, é credenciar agências de intercâmbio que considerarem “sérias” para promover os seus cursos.

Hoje, 3,5% dos alunos de graduação nos EUA vêm de fora do país. “A média ideal é de 10% para que os estudantes americanos aprendam sobre outras culturas e façam contatos que serão importantes no futuro”, diz Mitch Leventhal, presidente do conselho e da Universidade de Cincinnati (Ohio).

Ele diz que alunos de países de economias emergentes, como Brasil e Rússia, estão entre os mais procurados. “A prioridade são alunos de ótimo nível, que sirvam de exemplo para os outros, mas a diversidade é muito valorizada. Em Cincinnati, dos quase 2.000 estrangeiros, 55% são chineses, sul-coreanos e indianos. Temos só cinco brasileiros, muito pouco para um país estratégico, que nossos alunos precisam conhecer melhor”, diz Leventhal.

André Simonetti, gerente de universidades da Central de Intercâmbio, em São Paulo, diz que poucos o procuram para estudar nos EUA. “O custo do estudo é alto e o aluno precisa ter um nível de inglês muito avançado, comprovado no [exame de proficiência] Toefl, o que nem todos conseguem.”

Em média, estudar nas instituições participantes do conselho custa de US$ 10 mil a US$ 20 mil por ano (em torno de R$ 23 mil a R$ 46 mil).

O conselho espera filiar cem membros nos próximos meses. Nos 40 atuais, há instituições como a Universidade do Colorado, em Denver, e a Universidade do Texas, em Santo Antônio. Harvard, Yale e outras estreladas não se filiaram -nem deverão, diz a Airc, por já serem muito visadas.

Diploma nem sempre é aceito no Brasil

A criação do conselho de universidades americanas para atrair estudantes estrangeiros repercute na imprensa europeia e asiática como grande oportunidade, mas os estudantes brasileiros precisam ficar atentos às desvantagens que a experiência pode representar.

Não existe garantia de que o diploma de graduação obtido em instituição estrangeira será aceito no Brasil. Para conseguir validá-lo aqui, é preciso procurar uma universidade pública nacional, na qual uma banca analisará se a grade curricular do curso é compatível com a que ela oferece.

Esse grupo de professores que analisa o diploma estrangeiro tem autonomia para pedir que o aluno faça provas para atestar o aprendizado -e também para negar a validação. “Nacionalizar” o diploma é imprescindível para exercer profissões que exigem registro, como engenharia (Crea) ou medicina (CRM).

É importante que o estudante consulte a embaixada do país no Brasil e universidades públicas brasileiras antes de se decidir sobre o curso.

Para ter uma boa experiência, é também preciso pesquisar sobre as características do país. “Em alguns lugares dos EUA e do Canadá, por exemplo, o inverno é rigoroso e escurece muito cedo, o que pode aumentar a sensação de solidão. Além de se preocupar com o nível do ensino, o estudante deve buscar informações sobre como será sua vida na cidade”, diz Patrícia Lumy, gerente de ensino superior internacional no STB.

Turma

A integração com colegas locais pode não ser plena. Em universidades com mais estrangeiros, costuma ser mais fácil fazer amigos que também chegaram sozinhos até ali.

O nadador Cesar Cielo, 21, ouro nas Olimpíadas de Pequim, estuda comércio exterior no Alabama e diz conviver bem com americanos e outros estrangeiros. Ele ganhou bolsa de estudos na Universidade de Auburn por ser atleta, mas, para ingressar, teve de conquistar notas altas nos exames SAT (prova de conhecimentos verbais e matemáticos) e Toefl (de proficiência na língua inglesa).

“A universidade aqui tem estrutura de pós no Brasil: você escolhe as aulas e a velocidade em que quer se formar. Os trabalhos são muito pesados, sempre temos de fazer uma apresentação para a sala e, no meu caso, ainda concilio isso com os treinos”, diz ele, para quem o curso o ajuda a administrar a carreira de esportista.

“Os professores gostam de ter estrangeiros na sala de aula e sempre pedem exemplos em nossos países sobre o que estão ensinando. Estar ali é bom tanto para nós quanto para os americanos”, diz.

Dólares

A oportunidade que se abre para os estudantes tem contrapartidas para a faculdade além da experiência internacional que oferece aos alunos: visa também aumentar a arrecadação anual.

Nos EUA, municipais e estaduais cobram anuidade em dobro (ou triplo) de quem vem de outro Estado, o que se aplica também a estrangeiros. O problema é que estudantes americanos só costumam atravessar a fronteira estadual -e, assim, desembolsar mais- quando aceitos em instituições famosas, como a Universidade Stanford (Califórnia).

“As públicas americanas têm grande perfil empresarial, de preocupação com receita. Isso não quer dizer que elas não sejam boas. É preciso pesquisar e tomar cuidado na escolha, mas essa pode ser uma boa oportunidade para ter uma formação diferenciada, especialmente nas áreas de gestão, tecnologia e saúde”, diz Carlos Monteiro, consultor em ensino superior.

Uma das vantagens de fazer faculdade nos EUA é que, diferentemente do que acontece na Inglaterra, por exemplo, não é preciso estudar um ano complementar ao ensino médio, já que os americanos também estudam 11 anos antes de ingressar no nível superior.

Na Inglaterra, contudo, é comum que o estrangeiro seja dispensado do período complementar se cursou um ano de faculdade no país ou se concluiu curso técnico com quatro anos de duração.
(Folha de SP, 11/1)

Fonte: Jornal da Ciência 3678, 12 de janeiro de 2009.