Parlamento da UE quer reduzir meta de biocombustíveis

17 de setembro de 2008 - 09:56

Proposta ameaça reduzir ganhos do álcool brasileiro ao destinar parte da cota de energias renováveis para outras modalidades

Marcelo Ninio escreve para a “Folha de SP”:

A disputa interna que vem sendo travada em torno da nova política energética da União Européia teve um desdobramento negativo ontem para a ambição do Brasil de transformar o álcool em produto global.

A Comissão do Parlamento Europeu propôs rever a meta de expansão do uso de biocombustíveis estabelecida no ano passado, ameaçando reduzir os ganhos que o álcool brasileiro teria no enorme mercado automotivo da Europa.

A proposta aprovada pelo Comitê de Indústria do Parlamento aceita a meta original, de ter 10% do transporte do bloco movido a energias renováveis até 2020. Mas quer cortar para apenas 6% a cota dos biocombustíveis tradicionais, como o álcool. Os 4% restantes seriam de eletricidade, hidrogênio e biocombustíveis de segunda geração, como os feitos de celulose e resíduos.

A revisão da meta é resultado da pressão que têm sido feita sobre os parlamentares europeus por grupos ambientalistas e humanitários, que consideram os biocombustíveis uma ameaça à segurança alimentar, além de não garantir a redução da emissão de gases poluentes. De outro lado, os produtores de biocombustíveis europeus fazem seu lobby para que a meta seja mantida.

O comitê pede ainda uma meta intermediária, na qual, até 2015, 5% do transporte europeu passe para o biocombustível, sendo que um quinto desse percentual seria de eletricidade ou hidrogênio.

Encerrado o debate no Parlamento, a lei européia de energias renováveis precisa agora ser discutida pelo Conselho Europeu -a instância dos chefes de Estado do bloco- antes de ser voltar para uma votação final. O processo prevê um longo processo de negociação e inclusão de emendas, mas a Comissão Européia (órgão executivo da UE) tem pressa.

Fontes diplomáticas em Bruxelas disseram à Folha que o mais provável é que haja um acordo para que o pacote retorne ao Parlamento em dezembro, para ser aprovado em uma única sessão. Diante dessa perspectiva, espera-se que a proposta aprovada ontem no Parlamento seja modificada, aumentando a expansão dos biocombustíveis de primeira geração, como o álcool.

O Brasil acompanha esse processo com grande interesse, pois a ampliação do mercado europeu para os biocombustíveis é considerada um passo decisivo para transformar o álcool em commodity mundial.

Isso sem contar o aumento potencial na exportação do produto. Segundo dados do Ministério da Agricultura, a UE é hoje o destino de 20% das exportações de álcool do Brasil, algo como 2,1 bilhões de litros em três anos. Por esse e outros motivos, uma fonte do Itamaraty lamentou a decisão de ontem como “ato de sabotagem contra os biocombustíveis”.

Enquanto isso, os ambientalistas comemoravam. “A votação no Parlamento Europeu reconhece os enormes problemas associados ao uso em grande escala dos biocombustíveis”, disse Adrian Bebb, da Amigos da Terra.
(Folha de SP, 12/9)

Fonte: Jornal da Ciência 3597, 12 de setembro de 2008