Colisão espacial

17 de fevereiro de 2009 - 04:23

Satélites russo e americano se chocam e deixam rastro quilométrico de lixo em órbita

No primeiro acidente do tipo já registrado, dois grandes satélites — por ironia, um dos EUA e outro da Rússia, países que na Guerra Fria montaram uma verdadeira constelação de satélites de espionagem — se chocaram na última terça-feira, criando uma nuvem de fragmentos de quilômetros de extensão e pondo em risco as telecomunicações e até o telescópio espacial Hubble.

A Nasa informou ontem, quando a notícia foi divulgada, que levará semanas até que possa conhecer a magnitude do acidente, ocorrido na órbita da Terra, a cerca de 800 quilômetros de altura, sobre a Sibéria. Os riscos para a Estação Espacial Internacional e seus três tripulantes, no entanto, seriam baixos.

— Sabíamos que um dia isso aconteceria — afirmou Mark Matney, um especialista em lixo espacial do Centro Espacial Johnson, em Houston, referindo-se à quantidade crescente de detritos no espaço.

A colisão envolveu um satélite comercial americano Iridium, lançado em 1997, e um satélite russo, supostamente militar, lançado em 1993, que não estaria funcionando.

O satélite russo estaria desgovernado, segundo Matney. O equipamento americano pesava 600 quilos e, o russo, quase uma tonelada.

Este foi o primeiro choque em alta velocidade de dois equipamentos espaciais intactos desse porte. Quatro outras colisões de objetos espaciais já foram registradas, mas foram consideradas incidentes menores por envolverem somente partes de aparelhos ou satélites bem pequenos.

Ninguém sabe dizer ainda com precisão quantos fragmentos se formaram com a colisão nem o tamanho deles. Mas o rastreamento está sendo feito pela Nasa e pela Agência Espacial Russa, Roscosmos.

— Neste exato momento, a conta já ultrapassa as dezenas — afirmou Matney. — Mas eu suspeito que chegará a centenas quanto a contagem terminar.

Se forem levados em conta os fragmentos microscópicos, a conta chegará aos milhares. A magnitude do risco para outros equipamentos importantes, como satélites de comunicação, localizados na órbita da Terra ainda está sendo determinada.

Não deve haver perigo para o ônibus espacial Discovery, cujo lançamento está previsto para o próximo dia 22, com sete astronautas a bordo, mas a missão será ainda confirmada nos próximos dias, segundo a Nasa.

Nicholas Johnson, especialista em fragmentos em órbita do Centro Espacial de Houston, afirmou que o risco de danos é maior para o telescópio Hubble e outros satélites de observação terrestre, que se encontram em órbitas mais altas, mais próximos da área de alcance dos fragmentos.

No início deste ano, segundo Johnson, tinham sido contabilizados cerca 17 mil fragmentos em órbita da Terra. Os objetos, com pelo menos dez centímetros de comprimento, vêm sendo rastreados pela Rede de Supervisão Espacial, operada pelos militares americanos.

Foi a rede que detectou as duas nuvens de fragmentos criadas na terçafeira com o choque.

Lixo é a maior ameaça a naves

O lixo espacial vem aumentado consideravelmente nos últimos anos, em parte por conta da destruição deliberada de satélites antigos.

A situação é tão preocupante, que os fragmentos em órbita representam hoje a maior ameaça para as naves espaciais — ultrapassando os perigos do lançamento e da reentrada. A Nasa mantém um contato regular com a rede, sobretudo para manter a Estação Espacial em segurança e quando há espaçonaves no espaço.

— As colisões vão se tornar mais e mais significativas nas próximas décadas — afirmou Matney.

A Iridium Holdings LLC, de telefonia celular por satélite, tem 65 equipamentos ativos em órbita para atender a mais de 300 mil assinantes.

A empresa informou que a perda do satélite estaria causando alguns danos leves ao serviço, mas que, até hoje, o problema estaria resolvido.

A empresa negou ser a responsável pela colisão. Mas Igor Lisov, um especialista russo em espaço, afirmou não entender por que os especialistas da Nasa e da Iridium nada fizeram para impedir o choque, uma vez que o satélite americano estava funcionando e poderia ter tido a órbita ajustada.

— Pode ter havido um erro do computador ou uma falha humana — afirmou. — Pode ser também que eles estivessem prestando atenção em fragmentos menores e ignoraram os satélites desativados.

As causas do acidente ainda estão sendo investigadas.
(O Globo, 13/2)

Fonte: Jornal da Ciência 3702, 13 de fevereiro de 2009.