Ceará vai ganhar centro de pesquisas de medicamentos
11 de janeiro de 2010 - 07:35
Está sendo construída em Fortaleza, no bairro Porangabussu – região que abriga vários prédios ligados ao ensino superior das ciências da saúde – a nova sede do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamento (CPDM) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Com capacidade para cerca de 200 pessoas entre técnicos, estudantes e professores, ele será, segundo os seus idealizadores, o maior centro de estudos de medicamentos da América Latina.
Construído com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o novo CPDM será administrado por uma fundação, sem fins lucrativos, e deverá entrar em operação no primeiro semestre de 2010. Odorico de Moraes, coordenador do Laboratório de Oncologia Experimental (LOE) do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Faculdade de Medicina da UFC e um dos responsáveis pela construção do prédio, afirma que a idéia de construir o local veio do sucesso da experiência com o CPDM, que hoje funciona em uma sede de menor porte dentro das instalações da faculdade de Medicina da universidade.
O grupo atual do centro já realizou quase 300 ensaios clínicos, entre estudos de genéricos, fitoterápicos e fármacos anticâncer. “Foram feitos trabalhos para mais de 40 indústrias nacionais e internacionais”, afirma ele. Com a nova sede, a meta é ampliar a área de alcance do laboratório e abranger outras áreas da cadeia de medicamentos, como Química medicinal, farmacotécnica, cirurgia experimental e tecnologia farmacêutica.
Serão 64 leitos para pesquisa – mais que o dobro da estrutura atual –, 16 ambulatórios médicos, um consultório dentário e 28 laboratórios, coordenados por 64 doutores. Tendo como principais linhas a pesquisa e a inovação e a prestação de serviços, o centro realizará, entre suas atividades, a bioprospecção de novas moléculas e a síntese química de compostos, todas as fases de testes farmacológicos (não clínicos, de avaliação de princípios ativos, pré–clínicos, com cobaias animais, e clínicos, com voluntários humanos), estudos de bioequivalência, desenvolvimento de novas formulações e formação de recursos humanos na área de P&D de medicamentos.
Além disso, Odorico ressalta que o futuro CPDM visa promover a interação com indústrias farmacêuticas do Brasil e de outros países e criar, além de um banco de extratos e moléculas, uma incubadora de empresas do setor. A idéia é tornar o Ceará uma referência em registro de patentes e prestação de serviços para a indústria farmacêutica.
Para o pesquisador, um dos principais motivos para a idéia de criação de um centro de grande porte é a grande deficiência, no Brasil, na área de pesquisa de medicamentos. Atualmente, esse é um setor fortemente concentrado nas mãos de grandes multinacionais e não há muita produção no país. Entre os problemas daqui, há pouca capacidade de investimento das empresas nacionais em infraestrutura de centros de PD&I de medicamentos, precariedade das indústrias estatais e pouca interação entre o setor e as universidades. “Hoje, só existe no mercado um medicamento desenvolvido aqui: é o Acheflan, um fitoterápico”.
Os fitomedicamentos, (preparações contendo extratos padronizados de uma ou mais plantas), aliás, estão entre os focos do CPDM. Segundo a instituição, a produção de remédios a partir do extrato de plantas é uma atividade crescente e cada vez mais rentável. Nas últimas décadas, informa o CPDM, houve um aumento expressivo no mercado mundial desses produtos, especialmente nos países industrializados, onde ele movimento mais de US$ 30 bilhões por ano. No Brasil, em 2006, a cifra teria sido de cerca de US$ 410 milhões, correspondendo a 7,9 % do mercado brasileiro de medicamentos e maior que a comercialização dos genéricos, que foi de R$ 376 milhões.
Odorico ressalta, ainda, que o estudo de fitomedicamentos é uma tradição na pesquisa dos Departamentos de Fisiologia e Farmacologia e da Química da UFC. “Portanto, os conhecimentos acumulados ao logo de mais de três décadas de estudo de plantas medicinais confere aos pesquisadores do CPDM um valioso conhecimento que certamente deverá contribuir para o rápido desenvolvimento de fitoterápicos de qualidade em parceria com as indústrias nacionais”, diz.
Outra área de interesse social a ser abordada com o novo CPDM é a das doenças negligenciadas, males com pouco potencial de rentabilidade que, por isso, não recebem investimentos por parte dos grandes laboratórios mundiais. “Como as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação de medicamentos estão concentradas no setor privado, as doenças negligenciadas ficam definitivamente à margem dos avanços científicos e tecnológicos atualmente disponíveis”, explica Odorico. Ele acrescenta que milhares de vidas são perdidas ou prejudicadas por causa dessas doenças, que afetam o bem–estar das pessoas e as excluem das suas atividades sociais e produtivas.
Por fim, os idealizadores do CPDM acreditam que a unidade irá contribuir para a redução, existente hoje, da dependência brasileira de indústrias multinacionais. O setor de farmoquímica do Brasil, lembra Odorico, tem passado por sucessivos ciclos de incentivos e desestímulos e essa instabilidade prejudicou a produção nacional e interrompeu a atividade das subsidiárias dos grandes laboratórios na etapa final da síntese dos medicamentos. “Isso levou a uma situação preocupante na balança comercial brasileira. O setor químico, com importações anuais da ordem de 7,5 bilhões de dólares é, hoje, o maior responsável pelo déficit comercial brasileiro”, diz ele.
Como resultados futuros do novo CPDM, são esperados vários benefícios, não só para o Ceará, como para o setor de produção de medicamentos do Brasil. A instituição deve ajudar na formação de recursos humanos capacitados para atuar na fronteira do conhecimento científico dos fármacos e medicamentos, na promoção de transferência de tecnologia entre grupos de pesquisadores e empresas de produtos de saúde, no desenvolvimento de medicamentos, fitomedicamentos e produtos biológicos com qualidade, eficácia e segurança, no incremento do número de patentes registradas e de pesquisas com aplicabilidade na saúde humana, na identificação de condições e estratégias que favoreçam melhores resultados no desenvolvimento de medicamentos, na transferência de conhecimento em pesquisa clínica e criação de um Pólo Industrial Farmacêutico no Nordeste.
Fonte: Agência FUNCAP, 23 de dezembro de 2009.