As patentes e o desenvolvimento nacional, artigo de Renato Dolabella

27 de maio de 2009 - 07:33

“Muito do que é criado ainda não é aproveitado por variadas razões, como a falta de conscientização da necessidade de proteger ou falta de diálogo entre universidades e indústrias”

Renato Dolabella é advogado do escritório Dolabella Advocacia e Consultoria, mestre em propriedade intelectual e inovação pelo INPI e diretor administrativo do Instituto Mineiro de Estudos em Propriedade Intelectual e Inovação (IMEPI). Artigo publicado no “Valor Econômico”:

Nos 200 anos da implementação de sua legislação patentária, o Brasil encontra-se em posição discreta na lista de depósitos de pedidos de patentes, segundo números da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI).

Apesar do aumento de 18% na quantidade de pedidos brasileiros depositados em outros países por meio do “Patent Cooperation Treaty” (PCT), na comparação entre 2008 e 2007, em números absolutos figuramos ainda em posição acanhada nesse ranking, atrás de Índia, Áustria e Singapura. Nas primeiras posições da classificação da OMPI estão países como os EUA, Japão e Alemanha.

É também interessante apresentar as estatísticas do “United States Patent and Trademark Office” (USPTO), autoridade pública norte-americana que analisa os pedidos patentários naquela nação.

A quantidade de patentes depositadas nos EUA é comumente utilizada para estimar a geração de tecnologia pelos países, tendo em vista a importância do mercado norte-americano no consumo desses produtos e processos. Sem a patente nos EUA, o titular não terá nenhuma exclusividade de exploração naquele país, sendo importantíssimo o depósito para sua lucratividade.

Pela quantidade de pedidos concedidos em 2008, o Brasil ocupa apenas o 29º lugar, entre Nova Zelândia e África do Sul, ficando atrás de Malásia e Índia. Enquanto foram concedidas 101 patentes brasileiras junto ao USPTO no ano passado, países como Suíça, Israel e Austrália, por exemplo, obtiveram, cada um, cerca de dez vezes mais.

A questão das patentes no Brasil é antiga. Nossa primeira lei nesse campo foi promulgada, por Dom João VI, em 28 de abril de 1809. O Brasil foi o quarto país no mundo a possuir legislação na área patentária, após os EUA, Inglaterra e França.

Tratava-se de medida diretamente relacionada à chegada da família real portuguesa em nossas terras. Era preciso incentivar o desenvolvimento, o comércio e a industrialização da colônia. Já naquele tempo, as patentes eram vistas como ferramentas importantes para alcançar tais objetivos.

Ao longo desses 200 anos, temos o registro histórico daquilo que foi desenvolvido, no Brasil, em diversas áreas do conhecimento. É possível perceber a atuação dos inventores nacionais, que foram e são protagonistas na busca pela inovação, termo este hoje em moda e que não se esgota com as patentes. Entretanto, a criação patenteada carrega claramente consigo o ato de inovar, que provoca mudanças nos hábitos da sociedade com as novidades que origina.

Mesmo com esse histórico, podemos perceber que a existência de leis não é suficiente para alcançar os objetivos. Caso contrário, estaríamos em posição bem melhor na comparação com as demais nações, pois somos um dos pioneiros na implementação da legislação patentária.

Diante disso, é inevitável indagar como será o caminho que o Brasil deve seguir. Por que, mesmo com tanto história, o Brasil não está no topo dos rankings mundiais quando se trata de patentes? Quanto o país deixa de ganhar por não patentear mais?

Muito do que é criado ainda não é aproveitado por variadas razões, como a falta de conscientização da necessidade de proteger ou falta de diálogo entre universidades e indústrias para que a ciência gerada pelas primeiras possa ser efetivamente explorada no mercado pelas segundas, de modo a gerar ganhos para todos os envolvidos.

Em diversos casos, como as patentes, proteger corretamente a criação é requisito para que a mesma possa ser explorada economicamente com exclusividade. Aqui, deve-se destacar o papel do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), pois este é responsável em disponibilizar os mecanismos de proteção adequada, por meio da expedição dos certificados de concessão dos direitos aos titulares.

Mesmo quando o registro é facultativo, como no caso dos softwares e dos direitos autorais (estes registráveis perante a Biblioteca Nacional), realizar o procedimento formal de proteção é importante como um meio de prova da titularidade, além de viabilizar, em determinadas situações, a celebração de contratos de licenciamento.

Quanto à busca pela melhora da ligação entre a comunidade científica e a iniciativa privada no desenvolvimento, proteção e aplicação das novas tecnologias, deve-se ressaltar a promulgação das Leis de Inovação, federal e mineira.

É também importante a atuação de instituições de ensino, como a UFMG, que são polos de pesquisa científica e estão protegendo os resultados de seus estudos.

Voltando aos dados internacionais, é possível perceber que os países que mais crescem na criação e proteção de novas tecnologias são, em geral, nações em desenvolvimento. Ao que tudo indica, estas já elegeram a questão das patentes como estratégica.

O Brasil não pode adotar caminho distinto, deve incrementar, cada vez mais, as políticas públicas nessa área, que hoje encontram-se em fase de consolidação. Somente assim as patentes poderão ser utilizadas, de fato, como meio para a geração de riqueza para o país.
(Valor Econômico, 22/5)

 

Fonte: Jornal da Ciência 3767, 22 de maio de 2009.