Professor da UnB cria tijolo feito com papel

22 de abril de 2010 - 06:04

Material é produzido com embalagens de cimento e pode ser uma alternativa para construções consideradas ecologicamente corretas

 

   
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O experimento passou por testes de resistência a impactos e ao fogo e é apontado por pesquisadores da UnB como uma alternativa de uso na construção civil e de aproveitamento dos sacos de cimento, considerados altamente poluentes. “O saco de cimento inutilizado possui substâncias nocivas que contaminam o solo e até o lençol freático”, aponta a professora Rosa Maria Sposto, orientadora da pesquisa.

 

A fabricação do krafterra, nome dado ao bloco, é composta por cinco etapas. Primeiro os sacos de cimento são limpos para que os resíduos não causem danos ao equipamento. O papel kraft é posto então em água e agitado até formar uma polpa de celulose. Depois, o excesso de umidade é retirado, a celulose triturada e, em seguida, compactada com o cimento.

 

A técnica utilizada pelo professor na criação do bloco é semelhante a do Bloco de Terra Compactada (BTC). Segundo o empresário do ramo de construção sustentável e revendedor de máquinas para a produção de BTC, Carlos Prata, o material é utilizado principalmente na construção de casas populares, por ser mais econômico. O BTC é criado a partir da compactação de uma porção de solo junto a outros aditivos. Sua forma mais popular é o solo-cimento, que consiste numa mistura de 88% de terra e 12% de cimento. A diferença entre o krafterra e o BTC é que parte do cimento, cerca de 6%, é substituído pela fibra de papel kraft. “Esta substituição já garante uma economia na fabricação do bloco”, conclui Buson.

 

Resistência

A pesquisa do professor foi testar comparativamente o krafterra e o BTC. Nos testes de resistência a impactos e ao fogo, o krafterra teve melhor desempenho que o BTC. Nos de absorção de água, o BTC se saiu melhor.

 

“Nos testes de compressão simples, em que uma força é aplicada sobre uma parede do material, e o de compressão diagonal, em que o impacto é colocado nas pontas, o krafterra apresentou resultado surpreendente em relação ao BTC”, explica o professor. Nos testes de resistência ao fogo, quando duas paredes do bloco são submetidas a calor constante para medir a variação de sua temperatura, o krafterra chegou a cerca de 150° C depois de duas horas, enquanto o BTC foi a 180°C. “Devido a presença da fibra do papel, acreditávamos que o krafterra poderia não apresentar esta resistência ao calor. No entanto, os valores apresentados o qualificam inclusive como um material corta-fogo”, comenta Buson. 

 

Já nos testes com água, o krafterra apresentou cerca de 7,6% mais absorção que o BTC. “Este é um fator que torna a construção mais suscetível a infiltrações”, explica Busno. Uma solução achada pelo pesquisador foi a adição da seiva da babosa ao krafterra, diminuindo a absorção de água em 6% em comparação ao BTC solo-cimento. “A técnica de compactação é versátil porque permite a modificação das características do material através da adição de outras substâncias”, explica.

 

A inspiração para o krafterra veio da bagunça do canteiro de obras de um projeto de extensão no Varjão, coordenado pelo professor Buson. Um dia, enquanto organizava o terreno, ele se deparou com amontoado de cimento, terra e sacos de cimento que apresentava uma resistência fora do comum. “Era difícil remover aquela massa de lá, percebi que a presença do papel kraft era o motivo da resistência”, lembra Buson.

 

Reciclagem

Apesar dos testes com o krafterra, Buson ressalta que ainda é cedo para a utilização da tecnologia na construção. A próxima etapa agora é avaliar o comportamento do krafterra em canteiro experimental. “Uma coisa é o teste de laboratório do material, outra coisa é você testar uma construção feita com este material”, aponta Buson que pretende testar o material em um canteiro experimental.

 

Para Carlos Prata, a vantagem do BTC e do bloco desenvolvido pelo professor é o uso sustentável. “O BTC é fabricado na própria construção, de acordo com a necessidade do construtor, e pode ser reutilizado”, explica. “Você pode desmanchar a construção e reaproveitar o material”.

 

O mesmo processo de reutilização ocorre com o krafterra. Além da reciclagem do material, a própria fabricação dele é baseada no reaproveitamento de um entulho: o saco de cimento. Segundo dados do Sindicato Nacional de Indústrias de Cimento, em 2008 foram distribuídos no país cerca de 740 milhões de sacos de cimento.

 

Segundo a vice-presidente da Comissão de Meio Ambiente do Sindicato das Indústrias de Construção Civil (SINDUSCON-DF), professora Raquel Blumenschein, o saco de cimento não possui escoamento sustentável por não ter quem processe este entulho. Ela participou da banca de avaliação do trabalho de Buson e considera o trabalho como uma alternativa a adoção de material de uso sustentável na construção civil. “Mas é preciso verificar como o krafterra dialoga com outras tecnologias de construção”, observa. Ela afirma que o uso de tijolos de cerâmica e de cimento ainda são predominantes em obras no DF.

 

Por Marcus Lacerda, da Secretaria de Comunicação da UnB

 

Fonte: Site Rede de Tecnologia Social – RTS, 13 de abril de 2010.