Brasil testará vacina contra o câncer
18 de março de 2009 - 06:41
Nova forma de tratamento usa defesas do próprio organismo para impedir que tumor avance
Flávio Freire escreve para “O Globo”:
Lançada oficialmente ontem, a Rede Brasileira de Pesquisas sobre o Câncer começa a preparar os testes de uma vacina terapêutica para combater diferentes tipos da doença. Não se trata de uma vacina para evitar o surgimento do câncer, mas de um tratamento para fazer com que pacientes que tiveram a doença reforcem seu sistema imunológico para evitar novos tumores.
A vacina foi desenvolvida pelo instituto americano Ludwig, que cedeu o antígeno (substância que ativa o sistema imunológico) utilizado na medicação. Ele será associado a outras substâncias produzidas no Instituto Butantan, em São Paulo.
A partir dessa combinação, os pesquisadores vão analisar qual o tipo específico de câncer poderá ser combatido. Os primeiros testes com pacientes devem começar em cinco meses, avaliam os pesquisadores.
Confirmada a eficiência, a rede trabalhará junto ao governo, via ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia, para que essas vacinas cheguem gratuitamente aos pacientes, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
O genoma do tumor de mama em estudo Os antígenos utilizados pelo Instituto Ludwig foram descobertos em tumores de mama.
Eles foram estudados em testes clínicos realizados em três mil pacientes nos EUA. É por isso que pesquisadores da rede brasileira já trabalham no sequenciamento genético de células comprometidas pelo câncer de mama, como forma de acelerar o tratamento de vítimas da doença.
O tumor de mama é o de maior incidência em mulheres no Brasil.
— A célula cancerosa tem diferenças importantes em seu DNA. Se uma pessoa tem um câncer, o DNA da célula cancerosa é diferente do DNA da célula normal. Mas em que aspectos elas são diferentes? É isso que queremos descobrir. Vamos estudar o genoma completo, neste caso de um tumor de mama, e compará-lo com o genoma de uma célula normal — explicou o presidente da Conselho Nacional de de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Marco Antônio Zago.
A vacina terapêutica, entretanto, poderá ser aplicada no tratamento de tumores de pele, ovário e pulmão.
— A vacina deve funcionar para os cânceres que apresentem o antígeno com o qual estamos trabalhando — disse Paulo Lee Hoo, pesquisador do Butantan.
Nessa mesma linha, o diretor do Instituto Ludwig, Andrew Simpson, especialista no estudo de câncer de mama, avalia que pacientes que lutam contra esse tipo específico da doença deverão ser beneficiados pela vacina.
— Essa é uma vacina molecular e, para funcionar, temos que verificar qual molécula está presente no tumor.
E a maneira de fazer isso é pelo sequenciamento. Vão existir várias vacinas baseadas em moléculas diferentes e temos que saber qual será útil em cada paciente — afirmou.
— Estamos produzindo uma vacina que provavelmente vai ser aplicada em 40% de melanomas, 30% de tumores de ovários e 5% em câncer de mama. Não dá para oferecer uma mesma coisa para todo mundo — disse Simpson.
Temor de entraves burocráticos na liberação Em paralelo às pesquisas, os integrantes da rede brasileira já fazem gestões junto ao governo para viabilizar o acesso da vacina terapêutica aos pacientes da rede pública de saúde. Um dos temores é que o processo esbarre na burocracia.
De acordo com o diretor do Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, Luiz Eugênio de Souza, o bom andamento do processo dependerá de fatores como a comprovação da efetividade e a relação custo/ benefício: — Aí vai para uma decisão política — disse ele.
(O Globo, 4/3)
Fonte: Jornal da Ciência 3713, 04 de março de 2009.