Estudo contesta uso de teste genético
18 de fevereiro de 2009 - 05:30
Prática não tem comprovação científica e comercialização no País é considerada antiética por órgão regulador
Karina Toledo escreve para “O Estado de SP”:
O estudo do genoma com o objetivo de identificar predisposição a doenças como diabete e hipertensão ainda não está avançado o suficiente para garantir exames precisos, indica pesquisa publicada este mês na revista Public Library of Science Genetics.
Segundo pesquisadores das universidades americanas de Pittsburgh e da Califórnia, as informações levantadas pelos estudos genômicos de associação (GWA, em inglês) – que analisam marcadores genéticos para apontar predisposição a doenças – por enquanto são mais relevantes para entender a biologia das enfermidades do que para prever o risco individual de desenvolvê-las.
Eles analisaram a validade clínica de testes para diabete tipo 2, câncer de próstata, problemas cardíacos, degeneração macular relacionada à idade e doença de Crohn. Concluíram que os resultados não aumentaram a capacidade de predição das doenças se comparado à análise de fatores de risco tradicionais.
Para o presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica, Salmo Raskin, “esse tipo de teste será fantástico daqui a uns dez anos”. “Até lá, a gente deve conhecer todos os genes envolvidos nessas doenças complexas (mais informações nesta pág.) e saber qual é o peso da genética e o do ambiente para sua manifestação.” No Brasil ainda não há regulamentação sobre o uso desse tipo de exame, mas o Conselho de Medicina considera antiética sua comercialização.
No início deste mês, a rede brasileira de clínicas Anna Aslan, que oferece comercialmente esse tipo de serviço, teve uma filial interditada pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) e pela Vigilância Sanitária. A interdição ocorreu pela realização de procedimentos sem comprovação científica, uso de medicamentos sem registro e emissão de laudos por profissionais não habilitados. A unidade foi reaberta ontem por decisão da Justiça.
A rede oferece testes preditivos para diversas doenças, a um custo de R$ 900 a R$ 1.900. Segundo a assessoria do Cremers, a interdição ética continua valendo e os médicos que atuarem na clínica podem sofrer processo ético. “Eles se propõem a fazer terapêuticas que não têm comprovação e podem trazer risco à saúde”, diz o presidente do Cremers, Cláudio Franzen. “Nós comunicamos a todos os conselhos do País e é provável que isso se repita nos outros Estados.” A clínica tem unidades em São Paulo, Rio, Curitiba e Brasília.
O conselho de São Paulo (Cremesp) informou que abriu sindicância para investigar a filial paulista. “Se for constatado que as práticas verificadas em Porto Alegre também estão sendo feitas aqui, vamos tomar providências”, disse o presidente do Cremesp, Henrique Gonçalves.
Segundo ele, a comercialização de testes preditivos genéticos é uma prática antiética. “O conselho é extremamente favorável à pesquisa. Mas é preciso fazer projeto, pedir aprovação de um conselho de ética e fazer a pesquisa sem que a pessoa tenha de pagar”, diz.
“Quando você pega um produto que não tem comprovação científica e entra no mercado, está fazendo pesquisa em humanos sem aprovação, está enganando o paciente que paga pelo serviço.”
O médico Antônio Teixeira, um dos sócios da rede, diz que a clínica não faz pesquisa, apenas atua como ponte entre pacientes e o laboratório americano Genova, responsável pelos testes.
“Firmamos uma parceria há um ano. Colhemos o sangue e mandamos para lá. Eles mandam o resultado após um mês. Interpretamos e orientamos o paciente, por exemplo, a praticar atividade física, evitar fumo, álcool e manter a alimentação adequada.”
Para Teixeira, não há problema ético ou contraindicação para realizar os exames. “É preciso por em prática o conhecimento adquirido. Esse exame sozinho não vai dar um diagnóstico, mas dará pistas que podem ser essenciais para você tratar e prevenir doenças no futuro. Isso é a medicina preventiva”. diz. “Ético é tudo aquilo que você pode fazer para o bem-estar do paciente.”
(O Estado de SP, 14/2)
Fonte: Jornal da Ciência 3703, 16 de fevereiro de 2009.