USP também reprograma célula

10 de fevereiro de 2009 - 10:25

Cientistas de SP dizem que obtiveram pluripotentes sem o uso de embriões

Antônio Marinho escreve para “O Globo”:

Pelo menos mais um grupo no Brasil já domina a tecnologia de produção de células pluripotentes (capazes de se transformar em qualquer tecido) sem destruir embriões. A divulgação veio ontem, depois que cientistas da UFRJ afirmaram, na última sexta-feira, ter alcançado pela primeira vez sucesso nesta experiência.

Pesquisadores do Hemocentro do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP) já haviam realizado a mesma façanha em novembro de 2008, a partir de células da pele. Mas, disseram, os resultados não foram divulgados porque os autores preferiram esperar a publicação em revista científica.

Nesta pesquisa, o DNA de células adultas é reprogramado. E são chamadas de células pluripotentes induzidas (iPS). Assim elas desenvolvem características genéticas de embrionárias. Enquanto no Rio o grupo de Stevens Rehen, diretor-científico do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, usou células renais de linhagem específica, a equipe do Hemocentro optou por células da pele, o fibroblasto.

Ainda esta semana a equipe do Hemocentro inicia a infusão de iPS em camundongos, para testar a sua semelhança com as células-tronco embrionárias. Se o resultado em animais for semelhante ao in vitro será possível pensar em dispensar os embriões. Outra vantagem é que as pluripotentes reprogramadas poderiam ser feitas a partir de células do próprio paciente. Portanto, não haveria risco de rejeição num provável tratamento de doenças.

Ferramenta de pesquisa

Para transformar as células adultas em pluripotentes é preciso usar vetores virais. Isto é, cientistas “infectam” as células com vírus atenuados, fabricados em laboratório. São eles que carregam os genes para as células e os inserem no seu genoma nuclear, uma técnica japonesa. Na UFRJ, Rehen introduziu quatro genes. No Hemocentro foram seis vetores (oct4, Sox-2, Nanog, Tcl-1, B-cat, c-Myc), diz a cientista Virgínia Picanço e Castro, do Laboratório de Biotecnologia.

Este trabalho contou com participação da equipe dos cientistas Flavio Vieira Meirelles (FZEA-USP) e Lygia da Veiga Pereira, do Instituto de Biociências da USP. Em meados do ano passado ela já havia obtido a primeira linhagem 100% nacional de células-tronco embrionárias.

— Conseguimos in vitro pluripotentes com uma combinação diferente de vetores usados por Rehen. Agora vamos tentar em camundongos — diz Virginia.

O projeto no Hemocentro começo em 2007, com a colaboração de Elisa Maria de Sousa Russo Carbolante, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas Ribeirão Preto-USP, e supervisão de Dimas Tadeu Covas presidente do Hemocentro.

— Nossa combinação de vetores é diferente das usadas até hoje. Após sete dias de cultivo houve a formação de colônias morfologicamente idênticas àquelas de embrionárias humanas. O método iPS elimina a controvérsia do uso de células embrionárias humanas e tem a vantagem de reprogramar as células do próprio paciente — explica a pesquisadora Elisa.

Lygia da Veiga afirma que a produção de células pluripotentes sem destruir embriões é uma “ferramenta de pesquisa poderosa” e mostra que o Brasil tem uma comunidade científica competente. — Com vontade política de incentivo à pesquisa, a ciência brasileira avança.

Os pioneiros na técnica no mundo

Quatro países já publicaram estudos com células iPS em literatura científica: Japão, Estados Unidos, China e Alemanha. Em 2007, as equipes de James Thomson, da Universidade de Wisconsin, e Shinya Yamanaka, da Universidade de Kioto, reprogramaram fibroblastos, tornandoos pluripotentes.

Outras nações, como Brasil, Inglaterra, França e Israel, estão bem avançadas nesta área. O grupo do Hemocentro deve publicar seus resultados no “Brazilian Journal of Medical and Biological Research” ainda em fevereiro.
(O Globo, 27/1)

Fonte: Jornal da Ciência 3689, 27 de janeiro de 2009.