Profª Glaucíria Mota afirma em entrevista a necessidade de fortalecimento de Políticas Públicas

5 de julho de 2017 - 14:20

O Diário do Nordeste publicou no último sábado, entrevista com a Profª. Glaucíria Mota.

Confira a integra:

 

Que fatores podem ser associados ao extermínio de adolescentes em Fortaleza?

Há uma multiplicidade de fatores. Mas, o que me chama atenção nas pesquisas, nos 25 anos que trabalho com o tema da segurança pública, é que, embora haja um grande movimento da sociedade civil e dos governos em projetos para a juventude, essas políticas não têm impactado na diminuição de homicídios ou na redução dessa violência.

Na cidade, que jovens estão mais vulneráveis a homicídios?

As políticas públicas sabem quem está morrendo e quem está matando. Muitos estão envolvidos em conflitos nas próprias comunidades, perto de casa. Às vezes, eles morreram por pequenas disputas ou dívidas do tráfico. Em outras, foram vítimas por estarem no lugar errado, na hora errada. Por isso, temos visto essas recentes microchacinas, que se tornaram uma invenção perversa para eliminar os conflitos e os inimigos: você não mata só o alvo, mas todo o grupo.

Que efeitos a recorrência dessas mortes cria nas comunidades onde elas acontecem?

Nós temos hoje um gargalo nos sistemas Judiciário, Penitenciário e Policial. São três sistemas que atuam diferentemente e não têm muito contato entre si, embora devessem ter. Então, se percebe não só a concretude da impunidade, mas também um sentimento muito grande de impunidade na sociedade.

A pressão pelo consumo influencia na entrada do jovem no crime?

Pode influenciar. Eles se perguntam: “se o jovem da Aldeota ou do Meireles pode custear uma vida de qualidade, por que eu não posso?” Então, para ter acesso a determinados bens, a um tênis, a um boné, a um cordão de ouro, eles vão comprometer a própria vida, ou curtir a vida num pequeno período de tempo. Eles estão envolvidos sim, nos homicídios, mas eles mais morrem do que matam.

Qual deve ser o papel da segurança pública nessa questão?

Durante o tempo que tenho observado a segurança pública, não há muitas diferenças. Às vezes, ela avança, mas, de repente, há sempre um retorno ao passado, à atuação repressiva. Me parece que as abordagens policiais são seletivas e discriminatórias, que não levam em consideração o direito desses jovens de ocupar praças e áreas de lazer. É como se todo jovem da periferia fosse um bandido em potencial; mas, não acredito que seja necessariamente isso. A Polícia poderia ser mais protetora e garantidora dos direitos dessa população do que um algoz. Tentam-se modelos, como o Ceará Pacífico é agora. É preciso uma política preventiva, mas ela tem que ter robustez, e o Ceará Pacífico não tem isso.

Que caminhos podem ser apontados para a redução dos homicídios na adolescência, em Fortaleza?

Embora se precise enfrentar o crime, que encontrou, com seus microtentáculos, uma maneira de se sustentar, a resolução dessa problemática não se fará pelas vias da segurança pública ou da atuação policial repressiva, mas pela via de políticas públicas efetivas. Você não pode esperar que uma política pensada num governo vá dar frutos repentinos em dois ou quatro anos. Elas têm que ser pensadas a curto, a médio e a longo prazo, e de forma integrada, ou não resolverão o problema. Os dados estão nas pesquisas. Não está mais na hora de defender políticas, mas de corrigir as políticas para impactar na redução. São realidades que os municípios precisam encarar. (NP)

*Coordenadora do Laboratório de Direitos Humanos, Cidadania e Ética da Universidade Estadual do Ceará (Labvida/Uece)