Vida Administrativa e Acadêmica da Uece na Crise do Coronavírus

24 de março de 2020 - 17:55

 

A Administração Superior da UECE, como a das demais universidades brasileiras, e as gestões públicas em todos os níveis de poder, encontra-se diante de um fenômeno absolutamente novo e potencialmente destruidor de vidas, sociabilidades e rotinas gerenciais. Não poderíamos agir sem agilidade, mas também sem responsabilidade, perante o futuro de uma comunidade que, no nosso caso, chega a 30 mil pessoas, entre estudantes, servidores docentes e servidores técnico-administrativos.

Como médico psiquiatra, entendo o medo de todos perante a 1ª pandemia do mundo globalizado, também preciso compreender as reações equilibradas e desequilibradas, sejam regressivas ou impulsivas, de pessoas e grupos. Na sua grande maioria a instituição está se comportando de modo exemplar.

Como professor e pesquisador em Saúde Coletiva, entendo a dimensão que uma epidemia viral pode ter, seu curso e suas velocidades em cada etapa do curso, sua capacidade de contágio e sua letalidade. Também sei que vírus tem alta mutabilidade, portanto, seus passos precisam ser seguidos o mais próximo possível, mas sempre com a certeza de que estaremos um passo atrás, mitigando e reparando.

Como reitor da UECE, nestes últimos oito anos, conheço cada força e fragilidade de nossa instituição, sabendo muito bem os pontos positivos e negativos de nossa infraestrutura e de nossas equipes, podendo prever, portanto, como seria heterogênea a reação ao trabalho remoto e ao uso de tecnologias à distância, após longa história de presencialidade docente, por exemplo, além de estar atento ao explodir de emergências.

A partir do dia 16/03 todas as aulas presenciais foram suspensas, com a decisão do Governo Estadual de fazê-lo até 31/03, e a autorização de trabalho remoto para os componentes dos grupos de maior risco ao coronavírus. No dia 18/03, o Governo Estadual autorizou ponto facultativo para todos os servidores públicos até 27/03, tratando de modo especial os setores de saúde, segurança, alimentação e logística, por serem vanguarda no enfrentamento da crise.

Subitamente, sem preparação prévia, iniciou-se o remodelamento de uma verdadeira cidade: precisávamos mapear os setores que podiam paralisar ou fazer trabalho remoto, e os setores essenciais que precisariam atuar em algum modo de rodízio. Assim como toda sociedade, estamos construindo novas formas de levar a vida, para reduzir contágios, gravidades e mortes, além de mitigar a curva pandêmica.

No caso da UECE, precisávamos, também, enfrentar o problema legal das obras recém-contratadas e as emergências, como a do trecho de muro que caiu na lateral da Rua Justa Araújo e a da complexidade da obra de reparação de uma piscina olímpica, que estruturalmente não pode ser interrompida.

Precisávamos discutir com coordenadores de curso, da graduação e da pós-graduação, de todos os campi, o caminho da suspensão de aulas e das possibilidades de conclusão do semestre letivo, por meios eletrônicos, não presenciais, semestre esse que, na graduação, já apresenta aproximadamente 75% de suas atividades finalizadas.

Precisávamos equacionar os nossos convênios e contratos em realização, sobretudo os concursos públicos municipais que assumimos realizar. Também urgia enfrentar as etapas de nosso Vestibular, as etapas das seleções de bolsas estudantis, o funcionamento dos laboratórios biológicos, dos Restaurantes Universitários, do Hospital Veterinário, da Fazenda Guaiuba, da Comissão de Vestibular, do Departamento de TI, do Departamento de Gestão de Pessoas, da digitalização de processos para publicação no Diário Oficial, e a seleção pública de professores substitutos e temporários.

E havia a questão política, ética e legal do que fazer com o nosso processo de consulta eleitoral para escolha de reitor/vice-reitor da UECE, por meio de formação de lista tríplice a ser encaminhada ao Governador. O nosso calendário eleitoral, baseado na Lei de nosso Estatuto, no Decreto de nosso Regimento Geral e nas disposições de nossa Resolução Eleitoral, apontava para 22/05 como final do atual reitorado, portanto, apontava para 22/04 como prazo final para encaminhamento da lista tríplice ao governador.

Havia, no meio, a data da consulta à comunidade, marcada para 02/04, e a data da reunião do Colégio Eleitoral (CONSU + CEPE), marcada para 17/04. O Colégio Eleitoral envolve reunião de mais de 60 pessoas e a consulta, considerando a tendência histórica de comparecimento dos servidores docentes, servidores técnico-administrativos e estudantes, envolveria passagem pelas urnas de em torno de cinco mil pessoas.

Não poderíamos nos curvar diante do imediatismo de alguns que, em meio à pandemia, pensavam somente na campanha eleitoral. Diante da necessidade do rigor exigido ao gestor público, depois de observar as demais universidades públicas do Ceará, observar o comportamento das demais universidades estaduais brasileiras, analisar as determinações legais que caracterizam nossa vida social como em estado de emergência sanitária, participar como representante da UECE no Comitê Estadual de Enfrentamento à Pandemia, consultar à Assessoria Jurídica da FUNECE, criar o Grupo de Trabalho da UECE para o Enfrentamento da Pandemia e tomar decisões mais imediatas, começamos a publicar recomendações, normas e portarias para regularem nosso caminhar institucional, sobretudo a partir de 23/03, quando regulamos a suspensão do processo eleitoral. Entre 16/03 e 23/03 tivemos um feriado, um ponto facultativo, um sábado e um domingo.

Mesmo em situação de emergência sanitária, não se pode admitir que um gestor público responsável descure dos seus limitantes: a preservação da instituição, a consciência do prioritário e do secundário, a infraestrutura disponível, o pessoal disponível, os recursos financeiros disponíveis e a lei. A melhor maneira de nos apressarmos é fazendo-o com a cautela necessária à boa qualidade dos atos, como dita o oximoro latino, atribuído a Augusto, festina lente, ou apressa-te lentamente. Com agilidade e cuidado, seriedade e compromisso, estamos dirigindo a UECE em meio à dolorosa pandemia pela qual atravessamos, como um barco antigo ao navegar na cerração.

Prof. Dr. José Jackson Coelho Sampaio
Reitor da UECE