Professor da UECE usa imprensa tradicional e redes sociais como aliadas da divulgação

30 de agosto de 2021 - 09:29 # # # #

Superar fronteiras, democratizar o conhecimento e levar a ciência para muito além dos muros da Universidade são alguns dos objetivos do professor Hugo Fernandes, do colegiado de Ciências Biológicas da Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central (Feclesc), da Universidade Estadual do Ceará (UECE), ao utilizar as redes sociais e os meios de comunicação tradicionais, como rádio e televisão, para expandir o seu público. Desde que ingressou no quadro da Universidade, em 2016, o professor tem promovido ações para fomentar a pesquisa científica e aproximá-la da população em geral, alcançando um público muito maior que os seus alunos. Hoje, com o uso das redes sociais e a maior facilidade de acesso à internet pelo celular, ele leva o conhecimento científico para a palma da mão de mais de um milhão de pessoas por mês. Contando com aplicativos de compartilhamento de mensagens, esse número é muito maior.

Para o professor, em um período de avanço do obscurantismo e de questionamentos sobre aspectos já esclarecidos pela ciência há tempos, tornar o conhecimento científico mais atrativo e de fácil acesso a qualquer pessoa é fundamental para a construção de uma sociedade mais responsável, especialmente no tocante às questões sociais e ambientais. “A divulgação científica tem o objetivo final de formar. Formação no sentido de educar o indivíduo para entender os processos científicos, sua importância, suas limitações para entender o mundo a partir dessa óptica, independentemente da sua escolaridade”, destaca o professor, acrescentando que usar a tecnologia e as ferramentas de comunicação que chegam efetivamente aos cidadãos é fundamental para disseminar o conhecimento científico.

Hoje vê-se no Brasil uma quantidade enorme de smartphones e as “redes sociais ocupam a principal parcela entre as fontes de informação para a sociedade brasileira. Se a academia não ocupar espaços nessas redes de forma profissional e estratégica, vai assistir de camarote ao caos imperar. Isso vale para questões socioambientais ou para qualquer outro assunto que permeia a política brasileira”, afirma Hugo Fernandes.

Com o objetivo de atuar nessa frente, o professor Hugo Fernandes vem fortalecendo sua ocupação nas redes sociais, acumulando, hoje, 144 mil seguidores apenas no Instagram. O professor Hugo também atua nos meios de comunicação tradicionais (rádio e televisão), em que costuma dar entrevistas sobre as pesquisas desenvolvidas por ele e pelas equipes dos laboratórios que coordena na UECE. Na entrevista reproduzida a seguir, ele conta sobre a sua atuação na Universidade, a trajetória para ganhar espaço nos veículos tradicionais de comunicação e nas redes sociais e fala da importância da ciência para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Confira.

Qual é a sua história com a UECE?

Entrei no último concurso, em novembro de 2016. Faço parte do colegiado de Biologia da FECLESC, em Quixadá. O primeiro mês na universidade já daria a tônica do que faríamos nos próximos anos. Naquele dezembro, iniciamos uma pesquisa que viria a se tornar uma publicação internacional, além de elaborar peças de divulgação científica sobre impactos ambientais da seca do Açude do Cedro, que foi repercutido pela BBC, pelo France Press e pelo El Clarin. A conquista nos trouxe a responsabilidade de sistematizar e otimizar nossas atividades. Para isso, montei dois laboratórios, o Ciente e o Converte.

O Ciente (Núcleo de Divulgação Científica da UECE) é um espaço interdisciplinar que já recebeu mais de R$ 200.000,00 de financiamento para desenvolver a democratização da ciência no país.  Mais de 60% desse valor foi convertido em equipamentos e em bens duráveis para a UECE. Em uma das ações mais desafiadoras, organizamos o “Conhecer: Eleições Presidenciais”, o maior evento político-científico da história eleitoral do país, que reuniu, em julho de 2018, pesquisadores e divulgadores para um dia de sabatinas com oito candidatos à Presidência do Brasil, em São Paulo. Além disso, temos ocupado bastante a imprensa tradicional. Nesses quatro anos, apresentamos programas de TV, de rádio, e já foram mais de 100 entrevistas para veículos como Globo News, CNN, Jornal Nacional, Jornal Hoje, National Geographic, Scientific American, Piauí, GNT e GQ.

Para o pilar da Pesquisa, criei o Converte (Laboratório de Conservação de Vertebrados Terrestres da UECE). Já produzimos 16 publicações internacionais e nacionais, e nosso maior desafio agora é publicar o primeiro Livro Vermelho da Fauna Ameaçada do Ceará. Sou o Coordenador Científico e Coordenador de Mamíferos na Secretaria do Meio Ambiente do estado, com financiamento da FUNCAP, e praticamente todo o laboratório está envolvido nesse projeto agora. Mas temos ainda atividades do Plano de Ação Nacional (PAN) para a Conservação dos Felinos Brasileiros, do PAN Aves da Caatinga e da Lista Nacional de Roedores Ameaçados de Extinção, todos no ICMBio, além de projetos no Pantanal e em Fernando de Noronha.

Quando e por que o senhor começou a usar as redes sociais para divulgar a ciência?

Antes mesmo de entrar na graduação, eu tinha um pé na Comunicação. Trabalhei com rádio na adolescência e, acidentalmente, isso acabou trilhando muito do que eu viria a fazer na ciência. Comecei escrevendo textos político-científicos para blogs, em 2010. Em 2011, no Facebook, passei a unir fotografia de animais silvestres e informações biológicas, mas sem abandonar os textos de opinião. Em 2014, ministrei uma palestra no TEDx Fortaleza, onde fui convidado a assumir um programa de televisão na TV Jangadeiro (SBT) e um de rádio na Band News FM. Em 2018, o Instagram passou a ser a rede social mais ativa. Nossa equipe passou a produzir infográficos para educar a sociedade sobre temas urgentes como desmatamento na Amazônia, queimadas no Pantanal e, sobretudo, sobre a pandemia de COVID-19.

Qual retorno o senhor tem tido?

Há vários espectros de retorno. Em média, alcançamos mais de um milhão de pessoas por mês de acordo com as análises de redes rastreáveis, como Instagram e Twitter, mas uma parcela grande do que a gente produz viraliza no Whatsapp, onde não temos a menor noção do alcance. A receptividade tem sido bem positiva, e nosso maior reflexo disso são os convites para grandes veículos de comunicação e os financiamentos que temos conseguido aprovar. Porém, nem tudo são flores. Como tocamos em temas políticos sensíveis, precisamos lidar com ataques, ameaças e tentativas de hackers. Felizmente, são ações negativas pontuais diante das positivas e, além disso, temos uma ótima rede de apoio.

Qual é o perfil do seu público?

Varia muito de acordo com o veículo. Nas redes sociais, ele é 73% feminino, majoritariamente das regiões Sudeste e Nordeste, entre 25 a 34 anos e de classe média. Mas nós também temos uma parcela de jovens e idosos na casa das dezenas de milhares. Na rádio, nosso público é sobretudo masculino, acima de 35 anos e com perfil socioeconômico mais difuso.

Como o uso das redes sociais para divulgar a ciência pode ajudar a construir uma sociedade mais socioambientalmente responsável?

Hoje, há mais smartphones que pessoas no Brasil. Redes sociais ocupam a principal parcela entre as fontes de informação para a sociedade brasileira. A maioria da população não tem crédito para clicar num link de jornal ou agência de fact checking – na maior parte das vezes, não sabem nem diferenciar a qualidade de uma notícia – mas tem acesso gratuito a Whatsapp, Facebook e Instagram, fornecido pelas operadoras. Em resumo, você tem elementos perfeitos para provocar um cenário caótico de desinformação no Brasil. Se a Academia não ocupar espaços nessas redes de forma profissional e estratégica, vai assistir de camarote o caos imperar. Isso vale para questões socioambientais ou qualquer outro assunto que permeia a política brasileira.

Em um momento em que a ciência é muitas vezes questionada, como o senhor avalia o papel dos cientistas e da academia, de modo geral, na divulgação científica e na educação da população para o entendimento da importância da ciência?

Há um senso comum de que o papel da divulgação científica é traduzir o conhecimento científico para quem não entende ciência. Não é. O que chamam de “tradução”, ou seja, a adaptação da linguagem é algo tão básico que não pode ser chamado de papel. É como se eu falasse que o papel de um carro é fazer alguém girar a chave na ignição. A divulgação científica tem o objetivo final de formar! Formação no sentido de educar o indivíduo para entender os processos científicos, sua importância, suas limitações e como entender o mundo a partir dessa óptica, independentemente da sua escolaridade. E onde estão os profissionais que entendem e desenvolvem esses processos? Que dominam técnicas de transmissão do conhecimento? Que, embora sucateados, possuem alguma estrutura, possibilidade de financiamento e força de trabalho para desenvolver essas atividades? Estão na Academia. Sim, há não acadêmicos fazendo divulgação científica com excelência, mas a maioria de nós está nas universidades.

Além das redes sociais, quais outras estratégias o senhor avalia como importantes para aproximar a população da ciência?

A divulgação científica precisa ocupar todas as plataformas de comunicação possíveis. Obviamente, as redes sociais são mais democráticas. Muito embora um perfil bem desenvolvido, criativo e engajável demande muito trabalho, você consegue abrir uma conta com muita facilidade. Porém, não podemos dispensar plataformas que ainda impactam muito a população brasileira. Precisamos treinar nossos cientistas para darem entrevistas para TV, rádio e jornais. Não só passivamente, mas também de forma ativa, propondo pautas, escrevendo artigos de opinião e até mesmo apresentando quadros e programas. E isso pode ser feito em todas as escalas, desde rádios comunitárias até canais internacionais. A tragédia da pandemia de COVID-19 acabou trazendo holofotes não só para a ciência de per si, mas também para diversos cientistas. Certamente, quando esse inferno passar, esses holofotes tendem a esfriar, mas não se apagarão. Devemos estar preparados para essa realidade que demandará cada vez mais de nós. Inclusive, já estou articulando com a nossa equipe e a PROEX para oferecer um evento aos nossos colegas da UECE.