Educação financeira é caminho para realizar sonhos e obter qualidade de vida

23 de agosto de 2021 - 05:47

O número de brasileiros endividados alcançou a marca de 71,4% em julho deste ano, percentual recorde no levantamento realizado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) desde 2010. Já a inadimplência dos consumidores chegou 10,9%, ante 10,8% no mês anterior. Os dados apontam, dentre outras coisas, a dificuldade que os brasileiros possuem em lidar com o dinheiro, o que, em muitos casos, afeta os aspectos pessoais e profissionais. “Uma pesquisa feita pelo Banco Itaú mostra que os brasileiros têm dificuldade em tratar sobre o tema dinheiro. Cerca de 60% dos entrevistados nunca falam quanto ganham, 49% evitam pensar em dinheiro para não ficarem tristes e 46% não olham o próprio dinheiro porque acreditam que estão fazendo algo errado. Isso mostra a cultura brasileira, na qual a maioria das pessoas chega à vida a adulta sem saber lidar com o dinheiro. Isso resulta nos elevados níveis de endividamento até entre quem possui rendas mais altas. Nosso desafio é mudar essa cultura”, destacou a psicóloga, mestre em Educação e consultora financeira Aline Melo, que participou, na última sexta-feira (20) do seminário “Empregabilidade e os desafios da organização financeira”, o quarto seminário promovido pelo Qualifica Mais/Funece.

Durante o evento, que foi transmitido pelo canal do Pronatec/Funece no YouTube, a psicóloga destacou que os resultados negativos da falta de educação financeira vão além do endividamento e incluem questões como o pequeno número de pessoas que poupam e investem dinheiro, a maior vulnerabilidade a golpes ou gastos excessivos com bancos e empresas e a perda da qualidade de vida para trabalhar mais a fim de ganhar mais dinheiro. “A falta de educação financeira deixa as pessoas suscetíveis ao ciclo vicioso da vida financeira: falta de equilíbrio financeiro, necessidade de trabalhar mais para ganhar mais e realização de gastos excessivos pelo estresse. Isso faz com que as pessoas percam qualidade de vida, percam o poder de escolha do que vão fazer com a própria profissão. Quando a pessoa não tem educação financeira, ela precisa sempre estar correndo atrás do dinheiro. Isso acaba trazendo muitas dificuldades. Esse processo de correr atrás do dinheiro é muito danoso.

Para buscar a educação financeira e evitar os problemas que a má gestão do dinheiro pode ocasionar, a psicóloga lembra que o tema dinheiro não precisa ser chato e que não se deve focar só no dinheiro, mas na vida, uma vez que a questão financeira está diretamente relacionada a decisões que impactam a vida das pessoas. “Dinheiro faz parte da vida. Quando eu falo sobre o dinheiro e sobre o uso que vou fazer dele, estou falando sobre a minha vida, sobre as minhas escolhas, do que eu vou decidir em termos profissionais, do tempo que vou conseguir passar com a minha família, do tempo que vou ter com meus amigos etc.”, destacou, provocando uma reflexão nos participantes sobre o que o dinheiro significa na vida de cada um.

Dinheiro faz parte da vida

Para a psicóloga e consultora financeira, um dos primeiros passos para avançar na educação financeira está relacionado à visão que se tem sobre o dinheiro. “Falar de dinheiro é falar sobre vida. Quanto você ganha tem influência na sua vida financeira, mas não é só isso. É necessário considerar quanto você gasta, como você gasta e de que forma você se relaciona com o tema finanças, inclusive emocionalmente. Se o dinheiro é visto como um tema necessário e interessante, que você precisa entender para viver uma vida melhor, ele vai se relacionar com a sua rotina e seu sonho de vida, vai ser encarado como algo importante, o que te levará a buscar se capacitar para pensar sobre o assunto e mudar, a ter interesse em estratégias e formas de melhorar sua vida financeira”, afirmou Aline Melo.

Por onde começar

Mas por onde começar a construir uma boa educação financeira? Conforma psicóloga, o primeiro passo é entender de onde se está partindo: como é a vida financeira da família, como os parentes lidam com dinheiro, o que você aprendeu sobre isso. Compreendido o seu contexto de origem, o próximo passo é pensar sobre o padrão de vida desejado, abordando de forma realista as suas possibilidades de trabalho, de renda, prioridades de vida, desejos de consumo e a qualidade de vida buscada. O terceiro passo é fazer o padrão de vida desejado caber na renda que você possui.

“Realizar todos os nossos sonhos ao mesmo tempo não é possível, pois dinheiro é um recurso limitado. Então, é preciso fazer escolhas: o que priorizar? Como quebrar um objetivo em pequenos passos? Considere a renda, conheça os principais gastos que você precisa e quer ter e veja como coordenar o dinheiro”, orientou.

Equilíbrio

A psicóloga também lembrou que, para ter uma boa educação financeira e um bom relacionamento com o dinheiro, é necessário buscar equilíbrio entre passado, presente e futuro na vida financeira. O excesso de passado está relacionado à vida financeira que sua família teve e pode, por exemplo, gerar problemas com a abundância após a escassez, uma vez que a folga de dinheiro pode levar a decisões ruins. O excesso de presente pode levar à falta de controle, ao endividamento, à dificuldade em realizar sonhos maiores e à vulnerabilidade a imprevistos. Já o excesso de futuro pode gerar preocupações exacerbadas, perda de bem-estar no presente e risco de “chutar o balde” pelo acúmulo de rigidez.

“Mas como prevenir problemas e buscar equilíbrio? É preciso buscar informações e educação financeira, estar atento ao que você pensa e sente sobre dinheiro, acompanhar de perto a sua renda e os seus gastos e ter paciência consigo. Organizar as finanças não é natural, tem que ir entendendo e construindo sua forma de lidar com o assunto. Não veja o dinheiro como um tabu. Estude e converse sobre o tema. Tenha um planejamento. Não se deixe levar pelos seus gastos. Tenha poder de escolha sobre eles. Traga saúde para sua rotina ao não gastar tudo que ganha. Considere o salário líquido e já separe uma parte dele para poupar. Busque ter um orçamento flexível, que não acumule tantas contas fixas. Isso dá liberdade financeira. Tenha cuidado com as dívidas que antecipam realizações – muitos jovens acumulam financiamentos no início da vida adulta e engessam o orçamento. Se prepare para lidar com imprevistos financeiros. Eles sempre podem acontecer. Tenha uma reserva de emergência para se sentir mais seguro”, orientou a psicóloga e consultora financeira.

Conforme Aline Melo, para ser um adulto que cuida das finanças, é fundamental não trabalhar apenas para pagar boletos. É importante saber o que é importante para você e direcionar seus gastos para isso. “Foque nos seus objetivos e prioridades. Gastar por status, pelo que é importante para os outros, pode distanciar você dos seus sonhos. Poupe para realizar seus projetos: viajar, comprar um item mais caro, presentear familiares, abrir um negócio, mudar de emprego, fazer cursos etc. Como outras coisas na vida, a organização financeira pode ser feita do nosso jeito. Busque mais informações sobre o assunto e encontre as melhores estratégias para o seu caso. São as escolhas que a gente faz. É a vida que a gente quer viver”, finalizou.

Projeto de Vida

Ao encerrar o seminário, a coordenadora psicopedagógica do Pronatec, professora Ana Ignez Belém, lembrou que é necessário ter autoconhecimento e buscar a constante evolução. “Se você não olhar para o tema da educação financeira como parte do seu projeto de vida, você vai demorar muito mais tempo para viver essa vida adulta sem tanto estresse e questões que o próprio sistema capitalista nos impõe. A educação é uma das poucas vias que nós temos para superar as dificuldades e ter acesso ao que nos é direito”, afirmou.