ARTIGO: “A Derrota Eleitoral do Chavismo”, de Manuel Sutherland.

19 de abril de 2016 - 23:43

29 de março, 2016

 

O presente artigo, intitulado “A Derrota Eleitoral do Chavismo”, de Manuel Sutherland, foi publicado no jornal O Povo de 29 de março de 2016.

 

Pode também ser acessado através do endereço < http://www.opovo.com.br/app/opovo/mundo/2016/03/29/noticiasjornalmundo,3595095/a-derrota-eleitoral-do-chavismo.shtml >

 

 

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A Derrota Eleitoral do Chavismo

 

A profunda derrota sofrida pelo governo bolivariano na Assembleia Nacional e a crise atual são fatos que merecem uma análise extensa, que certamente não caberia neste espaço, o que nos leva a tratar tão somente das causas concretas do descalabro que atingiu a economia venezuelana.

 

É fora de dúvida que as proporções da crise na economia influíram desfavoravelmente no eleitorado venezuelano, que até então apoiava fielmente o governo bolivariano. A situação econômica crítica traduziu-se na elevada inflação (180% no ano de 2015), no déficit fiscal de dois dígitos pelo quinto ano consecutivo, na queda de 75% do preço do petróleo, no risco país para o investimento internacional (JP EMBI + 4145 pontos), na estrepitosa queda do PIB (-5.7% em 2015), na baixa quantidade de reservas internacionais e em uma enorme escassez de bens e serviços. A isso se acrescenta a fuga de capitais mais elevada do planeta.

 

Apesar das proporções do desastre, o governo realizou uma campanha bastante confiante no poder da sua máquina eleitoral, pois sua legenda, o Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV), conta com aproximadamente 7 milhões de inscritos e tem todos os recursos do Estado à disposição. Confiou também na ameaça propalada em sua propaganda, vendendo a ideia de que um triunfo da oposição representaria a eliminação de todo o aparato popular-assistencial de subsídios desenvolvido pelo Estado.

 

Já a oposição se centrou no tema meramente econômico, evitando suas anteriores sandices anticomunistas: que o governo tomaria os filhos dos trabalhadores, iria obrigá-los a compartilhar a esposa e expropriaria suas vestimentas. Os ridículos gritos de “liberdade” passaram a um segundo plano e tudo se concentrou em vender a falácia de que seu triunfo resolveria os gravíssimos problemas econômicos.

 

 

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Analisando os recentes desempenhos eleitorais do governo, tem-se que:

  • nas eleições presidenciais de 2013, Nicolás Maduro venceu com o total de 7.586.252 votos, apenas 224 mil a mais que seu adversário, significando que o chavismo perdera cerca de 700 mil votos em apenas seis meses;
  • já nessas últimas eleições o chavismo obteve somente 5.615.300 votos, quase 2 milhões de votos a menos que em 2013. Como a oposição cresceu em apenas 5%, isso parece indicar que boa parte do voto chavista não migrou para a oposição;
  • no final das contas, a oposição obteve 112 cadeiras contra apenas 55 do governo, que perde em cinco anos a vantagem de 43 deputados, quase 50% de seus legisladores;
  • a oposição obteve 68% das cadeiras do parlamento. O chavismo com um nada desprezível 42% dos votos, obteve apenas 32% das cadeiras;
  • no âmbito nacional, ocorreu a quase triplicação do voto nulo, comparado com a última eleição para o congresso.

Com esses números, a expressão da crise desenvolveu-se com maior ferocidade a partir da profunda carestia dos principais bens regulados. Referimo-nos a artigos de consumo intenso, como arroz, açúcar, leite, carne, etc. Filas de até 20 horas para comprar alimentos regulados a baixíssimos preços tornaram-se comuns. Os empresários que importam ou produzem tais produtos se negam a vendê-los aos preços que o governo lhes impõe, argumentando que a taxa de lucro é muito baixa e preferem retê-los, esperando que a regulação acabe, ou contrabandeá-los para Colômbia ou Brasil. A importação direta destes bens por parte do Estado tem estimulado desvios havendo centenas de funcionários encarcerados por delitos dessa natureza.

 

O resultado de tudo isso é uma escassez pertinaz e uma inflação de tal ordem que desestimulou o apoio popular do chavismo.

 

 

Manuel Sutherland é economista do Centro Venezuelano de Pesquisa e Formação de Trabalhadores e colaborador do Observatório das Nacionalidades