Pais apoiam invasores e até brigam com polícia
9 de novembro de 2011 - 10:51
Folha de S. Paulo – SP, 09/11/2011
Pais apoiam invasores e até brigam com polícia
Mãe de um deles chegou a ser detida; ‘clima é uma loucura’ afirma delegado
Enquanto aguardavam em ônibus, estudantes divulgaram carta em que dizem ser ‘os novos presos políticos da USP’
LAURA CAPRIGLIONE
DE SÃO PAULO
REYNALDO TUROLLO JR.
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
“Moço, posso dar um beijo na minha mãe?”, perguntou a jovem de 18 anos, estudante da história da USP, ao soldado encouraçado da Tropa de Choque da PM. “Não”, disse o policial. A menina nem ligou. Correu ao encontro da mãe, estalou-lhe um beijo sonoro na bochecha e voltou para a guarda do PM. A cena ilustra o clima que se instalou no 91º Distrito Policial, na zona oeste de São Paulo, depois que a Tropa de Choque ali despejou os 72 estudantes e funcionários detidos por participar da invasão da reitoria da universidade.
A PM bem que tentou organizar a situação. Mas o cenário era de caos. Nos fundos do DP, estavam estacionados os três ônibus da polícia com os manifestantes, que preferiram ficar ali, à vista da imprensa, de amigos e familiares, a ser colocados no andar de cima da delegacia, mais espaçoso e confortável. “Nem na Marcha da Maconha [protesto pela descriminalização da droga] eu vi tanta gente doida”, disse à Folha um delegado que trabalhava no flagrante. A poucos metros do policial, um jovem vestido com uma espécie de uniforme de super-herói, na cor rosa, esticava o livro “As Palavras e as Coisas”, do filósofo francês Michel Foucault, para as câmeras de televisão. O foucaultiano adversário das instituições repressivas posava junto a um colega, que exibia a obra “Lutando na Espanha”, relato do escritor George Orwell sobre a guerra civil da Espanha, que entre 1936 e 1939 opôs os fascistas de Francisco Franco aos defensores da República. Os jovens pediam a todo momento para ir ao banheiro -tinham de ser ser escoltados até o interior da delegacia. Aproveitavam o caminho para beijar as mães (como no caso relatado no início deste texto), acenar para os amigos, esticar as pernas. Cerca de 20 pais de estudantes presos desesperavam-se do lado de fora do DP.
COMUNICADOS
“Estamos indignados com o fato de que uma instituição educativa utilize a força policial como principal instrumento de solução de conflito social. Nossos filhos são estudantes e não bandidos”, escreveram, sem se identificar, em comunicado à imprensa. De dentro dos ônibus, um grupo redigiu uma nota rapidamente postada na internet, em que se denominavam “novos presos políticos da USP”.
Por volta das 15h, os jovens ligaram o giroflex de um dos ônibus (aquela luz brilhante e rotativa que fica em cima dos carros da polícia). Irritado com a confusão, um PM gritou com a mãe que conversava com a filha pela janela do ônibus. A mulher respondeu e acabou também detida -por desacato. Foi liberada horas depois. Na saída, 200 estudantes que protestavam na calçada ovacionaram-na. A faixa “Libertem nossos presos políticos” foi esticada na porta. Dentro do DP, a bagunça não era menor. Os alunos eram levados em grupos de dez para um salão com bancos de cimento. Ali, no meio do corredor, policiais colhiam as impressões digitais.
Pais, mães, amigos e militantes solidários conseguiram introduzir nos ônibus e dentro do DP litros e litros de Coca-Cola, pães, mortadela, maçãs, bananas e mamões para alimentar os detidos.
De pé, uma soldado da Tropa de Choque via os meninos comendo as delícias e lamentava: “E nós aqui, de pé, desde as 3h da manhã”. Eram 19h. Segundo essa policial, a tropa acompanharia toda a ocorrência até o seu término.