VOZES OFICIAIS E CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS HEGEMÔNICOS: UMA LEITURA BAKHTINIANA DO LIVRO "A ORDEM DOS PENITENTES".

BENEDITA FRANÇA SIPRIANO

Co-autores: JOÃO BATISTA COSTA GONÇALVES
Tipo de Apresentação: Oral

Resumo

Este trabalho toma como referencial teórico-metodológico a Análise Dialógica do Discurso, fundamentada a partir dos escritos do Círculo de Bakhtin: Bakhtin (2006, 2010, 2013); Volochínov (2011), Bakhtin/Volochínov (1990). O Caldeirão foi uma comunidade religiosa e agrária, desenvolvida entre os anos de 1926 e 1936, no Cariri cearense. Sob a liderança do beato José Lourenço, no sítio Caldeirão foi construída uma experiência de organização social comunitária em que os bens de produção e consumo eram coletivos. Com a justificativa de combate a um "reduto de fanáticos" e "foco de desordem", o Caldeirão foi invadido por forças policiais, em 1936, a mando do governo do Estado do Ceará. Nesta pesquisa, objetivamos analisar, a partir das categorias vozes sociais e horizonte social de valores, a construção dos sentidos do signo ideológico "fanatismo religioso", tomando como corpus o relatório oficial de polícia sobre a invasão ao Caldeirão, publicado em livro sob o título "A Ordem dos Penitentes". A abordagem bakhtiniana considera que os enunciados são permeados por uma multiplicidade de vozes sociais, que estão relacionadas a diferentes visões de mundo, pontos de vista, posturas ideológicas. Nessa perspectiva, os enunciados expressam sempre uma postura valorativa, um horizonte social de valores, que diz respeito a valorações, axiologias, construídas na dinâmica das interações sociais e compartilhadas por diferentes grupos humanos. O livro "A Ordem dos Penitentes" é fonte das vozes oficiais que criminalizaram o Caldeirão. O olhar lançado pelas camadas letradas da sociedade sobre as manifestações da religiosidade popular, no final do século XIX e início do século XX, é pautado, sobretudo, por correntes de pensamento europeias cientificistas. Assim, a partir desse horizonte de valores, o "fanático" é o "outro"; é a representação daquilo que se opõe à ideia de civilização e desenvolvimento e, portanto, deveria ser combatido em nome do progresso.