XXXIIIEncontro Nacional dos Estudantes de Química UniversidadeEstadual do Ceará 01 à 07 deFevereirode2015 |
Avaliação do crescimento de microalgas em meio contendo passagem de biogás, com foco na remoção do CO2 como parte da sua purificação
Jessika Arceno Perancetta1*(IC), Anderson Cardoso Sakuma (PQ)3,4, Pedro Ramos da Costa Neto(PQ)2
1. Universidade Tecnológica Federal do Paraná - PIBITI/CNPQ
2. Universidade Tecnológica Federal do Paraná
3. Institutos LACTEC
4. Pontifícia Universidade Católica do Paraná
*Jessikaperancetta@alunos.utfpr.edu.br
Palavras-chave: Biogás de aterro. Biorremediação. Microalgas.
Resumo
As pesquisas voltadas para práticas sustentáveis, utilizando recursos renováveis, vêm ganhando notoriedade em questões energéticas, devido à preocupação em diminuir ou eliminar a produção de contaminantes e poluentes ambientais. Com base nisto, o foco deste trabalho foi avaliar a purificação de biogás proveniente de um aterro sanitário em Curitiba (Caximba), desativado em 2010. A purificação foi realizada utilizando microalgas, a fim de reduzir a quantidade de CO2 presente no biogás, sendo utilizado um kit comercial para a comparação dos resultados. Paralelamente foi avaliado o crescimento das microalgas, verificando periodicamente a absorbância (DO540) do cultivo, visando observar a resistência da mesma quando exposta ao biogás. A purificação apresentou resultados promissores, visto que o teor inicial de metano no biogás bruto teve um acréscimo superior a 30% depois de purificado.
Introdução
A escassez de recursos naturais não-renováveis, aumento da demanda e suas implicações ambientais, têm estimulado a pesquisa e desenvolvimento de tecnologias alternativas de suprimento. Atualmente o biogás vem sendo visto não mais apenas como um subproduto obtido através da decomposição anaeróbia, mas sim como alvo de pesquisas, a fim de buscar novas formas de produção energética de modo que não seja necessário utilizar dos recursos naturais não renováveis (Costa, 2006).
O processo de biodigestão é a metabolização da matéria orgânica em condições de ausência de oxigênio. Em consequência aumenta a população de bactérias anaeróbias que degradam os compostos orgânicos, produzindo uma mistura de gases denominada biogás, o qual é composto prioritariamente por metano e gás carbônico. Este processo é dividido em três reações principais, a saber: hidrólise, acidogênese e acetogênese. Na hidrólise, os materiais particulados complexos (polímeros) são degradados em materiais dissolvidos mais simples (moléculas menores). Na acidogênese, os produtos, metabolizados na hidrólise são degradados pelas bactérias fermentativas acidogênicas. Na última etapa, acetogênese, as bactérias acetogênicas produzem substratos para a metanogênese, ou seja, para a formação de gás metano. Nesta etapa, as bactérias são divididas em dois grupos principais: as metanogênicas acetoclásticas, capazes de produzir metano a partir do acetato (sendo responsáveis por cerca de 60 a 70% da produção de metano) e as bactérias metanogênicas hidrogênotróficas, que são capazes de produzir metano a partir de hidrogênio e dióxido de carbono (LASTELLAA et al., 2002; NOVAK et al., 1975 apud SAKUMA, 2013). Tabela 1.
Tabela 1: Composição básica do Biogás em biodigestores.
Gás |
Símbolo |
Concentração no Biogás (%) |
Metano |
CH4 |
50 - 80 |
Dióxido de carbono |
CO2 |
20 - 40 |
Hidrogênio |
H2 |
1 - 3 |
Nitrogênio |
N2 |
0,5 - 3 |
Gás sulfídrico e outros |
H2S, CO, NH3 |
1 - 5 |
Fonte: La Farge (1979), Apud Coldebella (2006)
Para a geração de energia a partir do biogás é necessário a remoção de alguns componentes do mesmo como, agua, dióxido de carbono, ácido sulfídrico etc. A presença destes componentes torna o biogás menos eficiente em termos de poder calorífico e mais corrosivo (Frare, 2006).
Biorremediação consiste em processo de redução ou eliminação de contaminantes ambientais, sendo empregados organismos vivos, tais como: plantas, algas, fungos e bactérias, este procedimento biotecnológico de remediação tem sido fortemente pesquisado e recomendado, processo que consiste na mineralização dos contaminantes, sendo em meio gasoso CO2 ou liquido H2O. O processo biológico de biorremediação é uma alternativa ecologicamente mais adequada e eficaz para o tratamento de ambientes contaminados com moléculas orgânicas de difícil degradação e mais tóxico (Gaylarde et al., 2005).
No caso da redução do teor de dióxido de carbono no biogás uma perspectiva é o cultivo de microalgas como parte integrante do processo de purificação. A fotossíntese envolvendo microalgas e o dióxido de carbono existente no biogás para produzir biomassa (polissacarídeos, proteínas, lipídeos e hidrocarbonetos), que pode produzir biocombustíveis e/ou suplementos alimentares, se apresenta como uma alternativa motivante de tratamento de biogás, tendo em vista, a facilidade do processo e a possibilidade da sua combinação com um pré-tratamento químico para melhorar a eficiência. As microalgas produzem mais oxigênio de que todas as plantas juntas existentes no mundo, sendo responsáveis por pelo menos 60% da produção da produção no planeta (Chisti, 2007).
Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade do biogás produzido no Aterro da Caximba e a purificação do mesmo fazendo uso de cultivos de microalgas.
Metodologia
A seguir apresentam-se as etapas executadas no processo de purificação e análise do biogás.
1. Coleta da amostras de biogás.
A coleta do biogás foi realizada no Aterro da Caximba, que está desativado a mais de quatro anos, sendo selecionado devido a facilidade de acesso, disponibilidade de coleta do material e a praticidade, visto que o aterro já possui pontos de coleta. O biogás foi coletado utilizando bags de amostragens e compressão do biogás em cilindros de PVC, Figura 1.
A |
B |
C |
Figura 1. Foto do aparato utilizado para coletar o biogás para posterior análise. Compressor (A); cilindro de amostragem (B); bag de amostragem (C).
2. Caracterização do biogás bruto e purificado
Na avaliação das características do biogás foi utilizado um kit comercial (AlphaKit), que permite realizar analise de H2S e NH3 borbulhando o biogás para uma solução, produzindo um resultado colorimétrico. No caso do CH4 e CO2 a analise também é feita através do borbulhamento do biogás em uma solução, porem neste caso o resultado é dado pelo volume inicial e final de gás. Figura 2.
Figura 2. Foto do kit (AlphaKit), usado para avaliação dos teores de CH4, CO2, NH3 e H2S no biogás
3. Microalgas
Preparou-se um mix de microalgas contendo Chlorella vulgaris e Scenedesmus sp, alimentando o cultivo com meio CHU em laboratório, a cada 15 dias, Figura 3.
Figura 3. Foto do cultivo de microalgas das espécies Chlorella vulgaris e Scenedesmus sp, em laboratório, antes de ser usadas na purificação do biogás.
4. Purificação do biogás
No processo de purificação, o cultivo de microalgas foi inserido em um kitassato de 2 L que foi tampado com uma rolha perfurada, onde através do orifício na rolha o gás passava e borbulhava no meio contendo as microalgas. O aparato foi montado no próprio aterro da Caximba. Por fim, o gás depois de passar pela solução contendo microalgas era liberado pelo outro orifício presente no kitassato e posteriormente é feita a coleta para avaliação da purificação, bem como, retirada periódica de amostra do meio de cultivo para avaliar o crescimento da biomassa algal pelo método da absorbância densidade optica de 540 nm. A densidade óptica da amostra de cultivo retirada era lida em espectrofotômetro. O comprimento de onda empregado para a realização das medidas foi 540 nm, que está além dos picos de absorção de luz da clorofila-a e da clorofila-b (LOURENÇO, 2006). Desta forma, a densidade óptica é pouco afetada pelos pigmentos fotossintetizantes, que variam de acordo com as condições e com o tempo de cultivo, e é majoritariamente afetada pela obstrução da passagem de luz pelas células (VEGA; VOLTOLINA, 2007). Figura 4.
Figura 4. Foto do aparato usado para a purificação e coleta do biogás no meio algal.
Resultados e Discussão
Inicialmente foi realizada a caracterização do biogás que seria tratado, coletado em um ponto do aterro, onde o aterramento dos resíduos já tem mais de 12 anos. Tabela 2.
Tabela 2. Características do biogás bruto
Ensaio |
Metano (%) |
Dióxido de carbono (%) |
Ácido sulfídrico* |
Amônia * |
1 |
55,0 |
45,0 |
20/30 |
15/45 |
2 |
52,5 |
47,5 |
20/30 |
15/45 |
3 |
55,0 |
45,0 |
20/30 |
15/45 |
Média |
54,17 |
45,83 |
20/30 |
15/45 |
* Valores em ppmV
Posteriormente foi analisado semanalmente, por um período de 3 semanas, as concentrações, obtendo-se os resultados apresentados nas Tabelas 3.
Tabela 3. Valores obtidos durante a primeira semana do biogás passando pelas microalgas.
Ensaio |
Metano (%) |
Dióxido de carbono (%) |
Ácido sulfídrico * |
Amônia * |
1 |
70,0 |
30,0 |
20/30 |
15/45 |
2 |
65,0 |
35,5 |
20/30 |
45/110 |
3 |
67,5 |
32,50 |
20/30 |
15/45 |
Média |
67,5 |
32,5 |
20/30 |
1065/990 |
* Valores em ppmV
Tabela 4. Valores obtidos durante a segunda semana do biogás passando pelas microalgas.
Ensaio |
Metano (%) |
Dióxido de carbono (%) |
Ácido sulfídrico* |
Amônia * |
1 |
70,0 |
30,0 |
20/30 |
15/45 |
2 |
70,0 |
30,0 |
20/30 |
15/45 |
3 |
67,5 |
32,5 |
20/30 |
15/45 |
Média |
69,2 |
30,8 |
20/30 |
15/45 |
* Valores em ppmV
Tabela 5. Valores obtidos durante a terceira semana do biogás passando pelas microalgas.
Ensaio |
Metano (%) |
Dióxido de carbono (%) |
Ácido sulfídrico* |
Amônia * |
1 |
70,0 |
30,0 |
20/30 |
15/45 |
2 |
67,5 |
32,5 |
20/30 |
45/110 |
3 |
70,0 |
30,0 |
20/30 |
15/45 |
Média |
69,2 |
30,8 |
20/30 |
1065/990 |
* Valores em ppmV
Ao fazer uma comparação entre o biogás bruto com os purificados é notável a redução no nível de dióxido de carbono. Assim, ao comparar os valores das Tabelas 2 e 3 obteve-se uma purificação de 24,6 % e, ao comparar os resultados da Tabela 2 com os das Tabelas 4 e 5 verificou-se que as concentrações de metano nas amostras melhorou em 27,7%. Esta melhora purificação se deve ao aumento da concentração de microalgas na solução, visto que as mesmas foram alimentadas com meio CHU durante este período. A Tabela 6 retrata este crescimento das microalgas durante o processo de purificação, verificado pelo crescimento da biomassa avaliando pela absorbância 540 nm.
Tabela 6: valores de absorbância durante o decorrer da purificação semanal do biogás.
Semana |
Absorbância |
1 |
0,3511 |
2 |
0,6896 |
3** |
0,8849 |
** diluição 30% (V/V)
Durante a quarta semana, as concentrações do biogás não foram analisadas, porem, a absorbância foi e apresentou um valor igual a 0,7833 quando diluído a 30% (V/V), indicando que as microalgas começaram a morrer.
Quanto as concentrações do sulfeto de hidrogênio e amônia não demonstraram variações significativas no teste colorimétrico. Contudo, tal resultado já era esperado, visto que não foi realizada nenhuma purificação visando especificamente a remoção destes dois componentes.
Conclusão
Através dos resultados obtidos na purificação pela percolação em microalgas, observou-se um aumento médio na concentração de metano de quase 30%, podendo ainda ser melhorado se aumentar o tempo de residência durante a percolação.
Referências
CHISTI, Y. Biodiesel frommicroalgae. BiotechnologyAdvences, v. 25, p 294-306, 2007.
COLDEBELLA, Anderson, Viabilidade do uso do biogás da bovinocultura e suinocultura para geração de energia elétrica e irrigação em propriedades rurais. Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE, Paraná. f75. 2006.
COSTA, D. F. Geração de energia elétrica a partir do biogás de tratamento de esgoto. Dissertação (Mestrado em Energia) - Programa Inter-unidades de Pós-Graduação em Energia, Universidade de São Paulo, São Paulo-SP, 194p. 2006.
FRARE, L. M. Estudos para a implementação de uma planta para remoção de ácido sulfídrico de processos de produção de biogás. Tese (Doutorado em Engenharia Química) - Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 182p. 2006.
GAYLARDE, C. C.; BELLINASO, M. L.; MANFIO, G. P. Biorremediação - Aspectos biológicos e técnicos da biorremediação de xenobióticos. Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento. n.34, p.36-43, janeiro-junho, 2005.
LOURENÇO, S. de O. Cultivo de microalgas marinhas: princípios e aplicações. [S.l.]: Rima, 2006.
SAKUMA, Anderson. Desenvolvimento e análise experimental de biodigestores modulares de baixo tempo de residência. Curitiba, 2013. Acessado em 5 ago.2014 <http://www.pipe.ufpr.br/portal/defesas/dissertacao/254.pdf >
VEGA, B. O. A. (Ed.); VOLTOLINA, D. (Ed.). Métodos y herramientas analíticas em La evaluacíon de La biomassa microalgal. México: CIB, 2007.
Agradecimentos
Ao CNPQ, pelo apoio financeiro.
A empresa Estre na pessoa do Sr. Márcio Rey Fernandes, por permitir e auxiliar na coleta do biogás.