Marília Gabriela Gomes de Menezes ¹²* (IC), Ana Alice Gonçalves de Paula (IC)², Francisca Tatiana Regis Pinto¹² (IC), Glemilson Moita de Aguiar ² (IC), Natália de Sousa Augusto² (IC), Hanna Sabrina Lima Amorim² (IC), Victória Réggina Paulino Albuquerque² (IC), Maria da Conceição Tavares Cavalcanti Liberato (PQ)
1. Universidade Estadual do Ceará - FUNCAP
2. Universidade Estadual do Ceará - Curso de Química Licenciatura Plena
Palavra Chave: Méis. Apis melífera. Ceará
Resumo
Mel é o produto alimentício produzido pelas abelhas melíferas a partir do néctar das flores, das secreções procedentes de partes vivas das plantas ou de excreções de insetos sugadores de plantas que ficam sobre partes vivas das plantas. As abelhas recolhem, transformam e combinam com substancias específicas próprias, armazenam e deixam amadurecer nos favos da colmeia. Apesar do aumento da produção de mel, a procura pelo produto ainda é muito maior que a oferta, tornando o produto caro e incentivando adulterações. Foram realizadas análises físico-químicas através de reação de Lund e teste de Fiehe em amostras de méis produzidas pela abelha Apis mellifera L., de florada silvestre de diferentes cidades do estado do Ceará, com o objetivo de determinar possíveis alterações. Os méis apresentaram resultados satisfatórios para a reação de Lund, porém os resultados do teste de Fiehe foram positivos acusando um teor elevado de Hidroximetilfurfural (HMF), podendo indicar possível adulteração.
Introdução
Atividade de baixo custo inicial e fácil manutenção, a apicultura tem se apresentado como uma alternativa para as pessoas que vivem na zona rural. É de grande importância social, econômica e ambiental, pois além de gerar empregos na área rural, é bastante lucrativa e auxilia na manutenção da biodiversidade e equilíbrio do ecossistema, devido à ação polinizadora das abelhas. Nas estatísticas do IBGE, o Estado do Ceará aparece como o segundo maior produtor de mel da região Nordeste, no ano de 2001 (FREITAS; KHAN; SILVA, 2004).
O mel, produto apícola de mais fácil exploração, é considerado um dos alimentos mais puros da natureza, sendo uma mistura complexa de açucares altamente concentrada, contendo também ácidos orgânicos, enzimas, vitaminas, flavonoides, minerais e outros diversos compostos. Sua composição depende de fatores como: florada da qual o mel é proveniente, espécie de abelha produtora, estado fisiológico da colônia, estado de maturação do mel, região produtora, clima, etc. Estes fatores contribuem para caraterização de cor, odor e sabor de cada mel (VILHENA; ALMEIDA-MURADIAN, 1999).
O mel é considerado um importante alimento já que possui inúmeros efeitos terapêuticos como antianêmico, emoliente, antiputrefante, digestivo, laxativo e diurético. É especialmente indicado para permitir maior resistência contra o cansaço físico e intelectual em situações de atividade intensa, ajudando também a fortalecer o organismo contra os efeitos do estresse podendo ser utilizado em casos de doenças contra anemias, anorexia, atraso de crescimento, bronquites, conjuntivites, desnutrição infantil, emagrecimento, hipoglicemia, insônia, má dentição, nefrites, prisão de ventre, queimaduras (aplicação externa), tosses, úlceras externas e úlceras gastrointestinais (MEIRELES; CANÇADO, 2013).
Em meados do século XIX foram introduzidas no Brasil abelhas Apis mellifera vindas da Europa e conhecidas como abelhas italianas e germânicas. Em 1956, no entanto foi introduzida a abelha Apis mellifera scutellata de origem africana. Essas abelhas promoveram uma hibridização com as abelhas Apis mellifera já existentes no Brasil gerando a abelha Apis mellifera africanizada NOGUEIRA-NETO; IMPERATRIZ-FONSECA; KLEINERT-GIOVANNINNI; VIANA; CASTRO, 1986).
Apesar do aumento da produção de mel com a expansão da apicultura no Ceará, a procura pelo produto ainda é muito maior que a oferta, tornando o produto caro e incentivando adulterações, que geralmente são realizadas a partir da adição de açucares comerciais derivados de cana-de-açucar e milho. (ARAÚJO; SILVA; SOUSA, 2006)
Fraudes e adulterações de mel podem ser detectadas através das análises físico-químicas estabelecidas pela Legislação Brasileira para méis e indicadas pelo Instituto Adolf Lutz (MEIRELES; CANÇADO, 2013).
Este trabalho teve como objetivo determinar possíveis alterações em amostras de mel provenientes das cidades de Cascavel e Ibaretama no Estado do Ceará, ambos produzidos pela espécie de abelha Apis mellifera africanizada e de florada silvestre. As análises físico-químicas foram realizadas através de teste de Fiehe e reação de Lund.
Metodologia
As amostras foram obtidas através de apicultores das cidades de Cascavel e Ibaretama, sendo levadas ao Laboratório de Bioquímica e Biotecnologia da Universidade Estadual do Ceará onde foram mantidas à temperatura ambiente.
Reação de Lund
Esta reação indica a pureza da amostra de mel, através da precipitação de substâncias albuminoides presentes naturalmente no mel pelo ácido tânico que é adicionado (OPUCHKEVICH; KLOSOWSKI; MACOHON, 2012).
Na presença de mel puro, o depósito formado deve estar entre 0,6 e 3,0 ml (GARCIA-CRUZ; HOFFMANN; SAKANAKA; VINTURIM, 1999). Valores diferentes destes podem estar relacionados com o ganho ou perda de substâncias proteicas durante o processamento (FINCO; MOURA; SILVA, 2010). Quantidades inferiores podem indicar que o mel é artificial ou que foi adicionado com substâncias artificiais. Já quantidades superiores podem indicar que as abelhas foram alimentadas com hidrolisados proteicos (SCHLABITZ; SILVA; SOUZA, 2010).
Nesta análise, foram pesadas 2 g de cada amostra em béquers de 50 mL, que após serem diluídas em 20 mL de água destilada, foram transferidas para provetas de 50 mL, onde foram adicionados 5 ml de ácido tânico diluído a 0,5%. Posteriormente, foi adicionada água destilada até atingir o volume de 40 mL, depois agitado e deixado em repouso durante o período de 24 horas.
Este é um teste qualitativo baseado na coloração decorrente da reação entre o hidroximetilfurfural (HMF) e a solução clorídrica de resorcina (LEAL; SILVA; JESUS, 2001)
Tendo origem na degradação de enzimas presentes nos méis, o HMF foi utilizado como indicador de qualidade, pois méis maduros apresentam pequenas quantidades de enzima. Grandes quantidades de HMF podem indicar importantes alterações como armazenamento prolongado em altas temperaturas ambiente, superaquecimento ou adulterações provocadas por adição de açúcar invertido. Teoricamente, ao longo dos processos de armazenagem, méis com maiores taxas de frutose originarão maiores taxas de HMF. Méis recém-colhidos também podem possuir HMF, mas em pequenas quantidades (SILVA; QUEIROZ; FIGUEIRÊDO, 2004).
A presença desse composto em alimentos tem recebido atenção porque o hidroximetilfurfural e seus derivados apresentam atividade citotóxica, genotóxica, mutagênica e carcinogênica (SILVA; SCHUCH; VAINSTEIN; JABLONSKI, 2008)
Foram pesadas 5 g de cada amostra em béquers de 50 mL, depois foram adicionados 5 mL de éter etílico sendo então agitado vigorosamente. Posteriormente transferiu-se para tubos de ensaio onde se esperou o éter evaporar a temperatura ambiente. Em seguida, foram adicionadas ao resíduo 5 gotas de solução clorídrica de resorcina. Após 10 minutos foram observados os resultados das análises nas amostras.
Resultados e Discussão
Tabela 1- Teor de Substâncias Albuminoides e HMF em amostras de méis das cidades de Cascavel e Ibaretama no Ceará
Para a reação de Lund, a amostra de mel da cidade de Cascavel apresentou um depósito de 1,0 mL de substâncias albuminoides, enquanto a amostra de Ibaretama apresentou uma precipitação maior, de 2,5 mL. As duas amostras apresentaram valores dentro dos padrões estabelecidos na literatura. A diferença de
O mel é um produto em contínua modificação desde sua extração, o seu envelhecimento tem consequências sobre o aroma, sabor, cor (torna-se mais escura) e modificações químicas. A mais comum está relacionada ao teor de hidroximetilfurfural (HMF) (COULTATE, 2004). Essa reação ocorre em meios ácidos, sob aquecimento. O principal mecanismo é a β-eliminação e envolve também a enolização (RIBEIRO e SERAVALLI, 2004). O mel recém-extraído contém pouca quantidade de HMF. Porém se o mel é armazenado em temperaturas elevadas ou se for aquecido a diferentes temperaturas (superiores a 40 °C), os açúcares contidos no mel, especialmente a frutose, transformam-se em HMF por desidratação. Essa substância natural é produzida espontaneamente no envelhecimento do mel, sendo sua reação acelerada pelo aquecimento e sua medida pode ser considerada como um índice de envelhecimento. Na União Europeia, o teor máximo de HMF permitido em méis é de 40 mg/kg. Acima disso, o mel não poderá ser comercializado a não ser como mel industrial. Os méis ácidos (pH de 3,5 a 4,0) são mais sensíveis à produção do HMF, aumentando rapidamente o teor.
A Reação de Fiehe é feita para identificar a pureza do mel já que indica a presença de glucose comercial ou açúcar invertido e superaquecimento do mel. A Prova de Fiehe verifica a presença de açúcar comercial ou o aquecimento acima de 40°C, do produto, o que pode eliminar algumas de suas propriedades (IAL, 1985). O hidroximetilfufural (HMF) é um indicador da qualidade que auxilia na identificação de um produto fresco quando apresenta baixas concentrações, ou que tenha sido aquecido, estocado em condições inadequadas ou adulterado com xarope de açúcar invertido.
Para o teste de Fiehe, tanto na amostra de Cascavel, como na de Ibaretama observou-se um teor elevado de hidroximetilfurfural (HMF). Os resultados positivos podem indicar a possível exposição a altas temperaturas ou adulterações nas amostras de méis. White Júnior (1992) constatou que os méis de países tropicais podem ter naturalmente um elevado conteúdo de HMF, sem que o mel tenha sofrido superaquecimento ou adulteração. Isso pode acontecer por influência da temperatura ambiente elevada.
Conclusão
Conclui-se que com relação à reação de Lund, os méis apresentaram resultados muito bons indicando estarem livres de fraudes. Quanto aos resultados para o teste de Fiehe que apontaram valores elevados de HMF, como o estado do Ceará possui um clima que em determinados períodos possui altas temperaturas, é possível que a razão do resultado nessa análise seja o próprio clima e não adulterações intencionais. Quanto aos diferentes resultados encontrados a partir da reação de Lund, estes se devem às diferentes regiões onde cada amostra foi produzida.
Referências
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Agradecimentos
A UECE.