O presente trabalho tem como objetivo analisar as formas como as obras de irrigação
pensadas para o Ceará, durante o final do século XX, foram percebidas pelos diversos
setores nelas envolvidos. Para tanto, ressaltamos os discursos construídos sobre a ótica
do Progresso. Procuramos analisar desde os dizeres oficiais do Estado, cristalizados nas
publicações do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) até as falas
das próprias famílias impactadas. Buscamos compreender a partir da interpretação dos
usos e disputas da linguagem os conflitos sociais vivenciados com a chegada destas
obras e a exaltação da ideia do Progresso. Esses discursos do tempo progressivo
favorecem as fissuras entre passado, presente e futuro, produzindo a ideia de que o
futuro precisa ser completamente diferente do passado e o presente apenas um caminho
a ser superado. Aos poucos grande parte dessas obras propiciaram instabilidades nos
modos de vida de pequenos agricultores e agricultoras. Sob a premissa da geração de
emprego e renda e em nome do Progresso, o governo federal expulsou muitas famílias
camponesas dos seus locais de moradia, trabalho e lazer, aumentando, com uma força
brutal, os índices de concentração de terra nas regiões que receberam as obras de
irrigação. Aparentemente esse horizonte superior do futuro nunca chega e a maioria da
população ainda está a remoer esse passado que nunca passa.